quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Manuais escolares

Cada ano lectivo que se inicia é para muitos pais uma dor de cabeça com as despesas em material escolar, particularmente as que respeitam a livros de estudo. São caros os manuais escolares. E desde 2010, com a crise austeritária que então se iniciou, as dificuldades aumentaram muito para muitas famílias.
Em algumas escolas, esforços houve para se constituírem bancos de livros escolares, de modo a satisfazer algumas necessidades. Por outro lado, acções informais no mesmo sentido, quase sempre à volta das escolas, levadas a cabo por professores e funcionários, têm constituído apoio a casos discretamente tratados.
Não obstante ter que ser tida em conta a compensação económica dos autores de manuais e das editoras que os publicam, mais cuidado devia ser observado de modo a colocar no mercado livros rigorosos e com preços em conta, designadamente:

-  usando papel de menor “qualidade”, menos pesado e menos reflector da luz incidente (que agride e cansa os olhos, prejudicando o estudo);
- moderando o número de cadernos anexos, alguns perfeitamente dispensáveis [evitando os pacotes de livros (packs) para cada disciplina];
- havendo mais sobriedade e ponderação nas ilustrações (evitando variegados saturantes de cores espalhafatosas e os excessos na dimensão e número de figuras), assim como na multiplicação de grafismos que menosprezam a inteligência dos alunos, em desfavor da sensibilidade e adequação com que os textos e as questões deviam ser redigidos;
- prestando extrema atenção à correcção e actualização científica dos conteúdos e à redacção e bom uso da língua portuguesa.

Além disso é sempre pertinente o apelo dos professores a que os alunos utilizem os livros sem os danificar, tornando-os objectos estimáveis, úteis a cada um deles e a outros que os possam vir a usar, se houver a bondade de os disponibilizar no final de cada ano lectivo ou ciclo de estudos.
Por mais suportes de aprendizagem que se inventem, não andamos mal se cultivarmos o amor aos livros. Sobretudo nós, os professores. Este constitui um dos nossos muitos deveres.

José Batista d’Ascenção

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Regresso às aulas

Com o fim de Agosto, aproxima-se o término do Verão, que aos alunos acaba a parecer longo, aos pais se afigura uma eternidade e para os professores constitui uma preocupação retomada. É o tempo do regresso à Escola, com os custos próprios do recomeço.

Aparentemente, os estudantes frequentam as aulas com um grande à-vontade, os bons alunos com a determinação de aprender e com a consciência de que têm que aplicar-se mesmo nas disciplinas que não são as suas preferidas, e alguns dos menos bons alunos com a descontracção, por vezes excessiva, que deriva de tanto lhes interessar que seja assim como assado, ignorando a sua responsabilidade perante os pais, que nem sempre os acompanham de perto, e assumindo que os professores os não intimidam, seja na exigência de atenção e de estudo, seja no cumprimento das convenientes normas de disciplina.  A todos eles, porém, não é indiferente o início do ano lectivo. Na realidade, o regresso às aulas traz motivos de ansiedade para a generalidade dos alunos, especialmente para os mais pequeninos ou grandinhos que vão para a (ou para uma) escola pela primeira vez. Para jovens com idades entre os 11-17 anos, que ingressam numa nova escola, particularmente se não integrados em grupos ou, pelo menos, com alguém conhecido, os primeiros contactos, em particular para os mais tímidos, podem ser dolorosos. Conhecer e afeiçoar-se a novos espaços, colegas, funcionários e professores pode trazer dificuldades de monta, com uma dimensão que só os próprios conhecem, mas que não é pequena… nem simples.

Os pais, quando têm trabalho, e nenhum deles fica em casa, terminado o mês das férias, preocupam-se com o acompanhamento dos filhos que, dormindo as manhãs, ficam o resto dos dias agarrados aos dispositivos tecnológicos ou circulam ou frequentam espaços que estão (ou que eles sentem que estão) fora do seu controlo. E na situação dramática em que os pais estão desempregados, esse facto tenderá a agravar alguma tensão com a presença constante dos filhos em casa, num ambiente nem sequer favorável a uma saudável partilha das tarefas domésticas. Em qualquer dos casos, as condições podem não ser propícias ao diálogo fácil entre gerações, cavando algum afastamento entre os mais velhos e os mais novos. Já nem se fala dos avós, muitos dos quais vivem dias de solidão, afastados (fisicamente) de filhos e netos, havendo também os que passaram à condição de pais dos filhos dos filhos, os levam e trazem da escola e lhes preparam e servem as refeições. Uma sorte, nestes casos, cuja importância nem sempre é devidamente valorizada pelos adultos (pais), excepto quando esse bem inestimável, pela lei da vida ou por outros factores, se interrompe. Também estes avós se tornam mais imprescindíveis em tempos de aulas, quando há que retomar horários e adquirir rotinas.

Os professores (aqueles que ainda o podem ser…) terminam cada ano lectivo a almejar pelas férias, acalentando a esperança de que vão descansar e retemperar forças e ânimo, que viram minguar cada dia e cada semana dos meses anteriores. É muito difícil ser professor na actualidade. A profissão está muito desvalorizada aos olhos de todos (até dos próprios…) e o esforço que os docentes despendem rouba-lhes energia e ânimo, quantas vezes recorrendo a antidepressivos para poderem continuar. Com uma formação em psicopedagogia a roçar o “romantismo”, cedo os professores percebem que as exigências do ofício obrigam a recursos e procedimentos que não constam dos “manuais”. Para os docentes que pertencem aos lugares do quadro, a vida parece facilitada, mas as aparências iludem. Muitos professores com mais de 30 anos de profissão sentem-se sozinhos, a cumprir ordens e legislação em que ninguém acredita, normalmente para se obterem estatísticas (mais ou menos caseiras) em que se acredita menos ainda. A estes professores nem o cumprimento dos programas curriculares lhes serve de refrigério, tão pouco importante parece ser a boa leccionação de conteúdos concretos: a “boa imagem” de um professor na escola pode passar ao lado da qualidade das aulas que dá, o que não se compreende!
Os docentes mais jovens, cuja energia, disponibilidade e actualização de conhecimentos é fundamental para a vitalidade e eficácia das escolas, têm um papel (muito) mais difícil ainda do que o dos professores mais velhos. Desde logo a incerteza sobre se vão e onde vão ser colocados. O ano passado, a minha colega Paula C. fazia diariamente um pouco mais de 100 Km para vir trabalhar e outros tantos para regressar a casa. Levantava-se cedíssimo para deixar preparado o necessário para um filho criança, que, nos dias úteis, só via acordado, durante poucas horas, à noite. Estes professores, quando são colocados, como os seus horários são os últimos a serem compostos (é necessário, anteriormente, distribuir o serviço pelos recursos humanos fixos…) frequentemente ficam com várias disciplinas e com os tempos lectivos “espalhados” no horário, o que implica esforço acrescido. Há ainda o inconveniente terrível de só muito em cima da hora saberem o que vão leccionar, facto que pode tornar-se ciclópico, em termos da necessária preparação. Se a isto juntarmos a eventual necessidade de procurar alojamento, o quadro torna-se muito complicado.

Chegada a abertura das aulas há sempre, da parte dos professores, a expectativa de como serão e como vão reagir os alunos (nos casos em que não há continuidade). E da parte dos alunos passa-se algo da mesma natureza. Este misto complexo de relações inicia-se e desenvolve-se num universo intrincado de linhas psicopedagógicas a que os funcionários, os pais e a direcção das escolas podem ser quase alheios. De alguma forma é um “corpo a corpo” que dói, de modo particular, a cada um, mas em que cada qual se pode reinventar, em momentos compensadores. Potenciar esses momentos, é mister dos professores.
Vem aí o novo ano lectivo. Saibamos vivê-lo, construí-lo e merecê-lo:
- os alunos e seus pais;
- nós, os professores e a Escola.

José Batista d’Ascenção

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Sobre o último exame de biologia e geologia do ensino secundário

Opinião transmitida ao IAVE, na altura da “correcção”. O mesmo tipo de apreciação foi feita sobre o exame da 1ª fase, mas o inquérito foi submetido sem ter sido guardada cópia, razão por que não está disponível.

Análise global da prova - A prova está bem elaborada, tal como a da 1ª fase, por respeitar o âmbito dos programas, diferentemente do que tem acontecido em anos anteriores (ver opiniões emitidas aqui e aqui), e por ter um discurso claro, objetivo e bem articulado. Não obstante há pormenores que podiam estar melhor, compensando alunos e estimulando professores, sem diminuição do grau de exigência e de rigor.

Pergunta 7 do grupo II - Em vez de “tonicidade” devia ter sido usada a expressão “pressão osmótica” ou (mesmo) “concentração de solutos”, tendo em atenção a diversidade de conteúdos que é preciso abordar ao longo de dois anos, em âmbitos tão diferentes como o da biologia e o da geologia e cada uma destas áreas envolver conteúdos muito diversos, pelo que há poucas aulas para abordar e aprofundar cada assunto, o qual deve ser aferido no fundamental e não a partir de pormenores. Fosse assim, e em vez de tantos alunos falharem a resposta muitos a acertariam em proporções inversas ao que aconteceu.

Pergunta 3 do grupo IV - Uma questão formulada nestes termos, não obstante a facilidade da resposta, pode fomentar a ideia de que quando as células eucarióticas têm parede (caso das células vegetais ou dos fungos), o antibiótico referido poderia atuar contra elas, na suposição errada de que são semelhantes (quando na realidade são diferentes quer na composição química quer na estrutura). As minhas reservas resultam do facto de ver, em manuais aprovados pelo Ministério da Educação, listas descritivas de organelos celulares em que a parede celular está definida como “parede rígida que envolve as células vegetais e bacterianas, conferindo-lhes protecção e suporte”, apenas assim, como se se tratasse da mesma coisa…

Sobre a supervisão do processo de classificação e o funcionamento da plataforma
O número de classificadores agregado a um(a) supervisor(a) é excessivo (esse número estaria bem entre 15 e 20), o que transforma as tentativas de discussão numa baralhada…
Na plataforma deve ser desconectado o envio do que é registado para o “mail” de cada classificador (ou, no mínimo, torná-lo facultativo e dependente de activação do professor classificador). A “tempestade” de “mails” recebidos cria um efeito de desânimo e aversão horríveis. A discussão far-se-ia entre os classificadores apenas na plataforma, com os supervisores a só permitirem o debate de cada questão/resposta(s) no fórum respectivo.

Número de provas a atribuir a cada classificador
A cada professor classificador não deviam ser atribuídas mais que 50 provas no conjunto da 1ª e da 2ª fases. Durante muitos anos, quando havia mais alunos e este trabalho era pago à parte, nunca corrigi mais que esse número, nem mesmo quando me ofereciam essa possibilidade. Dar menos provas a cada professor classificador talvez reduzisse os erros de classificação e os gastos com apreciações de recurso. Qualquer ideia de que o que se chamou formação de classificadores do então “gave” contribuiu para fazer professores classificadores especialistas faz tábua rasa do facto de aquela (suposta) formação não ter servido para nada de útil (que se visse). O que é preciso é que as questões de exame estejam bem feitas e se situem no âmbito dos programas, os quais, embora discutíveis, são os que temos. E então, todos os professores que os leccionam estão em condições de classificar as respectivas provas de exame. Nem há razão para sobrecarregar uns professores e excluir os restantes de uma tarefa que muitos gostariam também de poder executar.

José Batista d’Ascenção

quinta-feira, 18 de agosto de 2016