quinta-feira, 27 de junho de 2019

Hino à pedagogia e ao que devia ser a (função da) Educação

Hoje, no jornal «Público», com o título «A Educação e a democracia» e subtítulo «A escola que serve a democracia não é a escola que se rende ao triunfo da infantilidade»

Um imenso obrigado ao autor: Francisco Assis

Para que conste.

José Batista d'Ascenção

Adenda: Obrigo-me a um período de «silêncio» neste espaço, enquanto estiver a «corrigir» provas de exame, que só por «força maior» não cumpriria.

quarta-feira, 26 de junho de 2019

Sobre o exame nacional de biologia e geologia (1ª fase, 2019) - Nota curta.

Seguindo o modelo habitual, a prova não é demasiado fácil nem demasiado difícil. As perguntas estão bem elaboradas, não fogem ao conteúdo dos programas, e são claras e objectivas. Qualquer aluno que não tire dez valores ou mais ou está mal preparado ou não esteve a fazer a prova nas melhores condições.
Partilho das preocupações de Helena Carvalhão Buescu, ontem explanadas num artigo intitulado «Facilitismo? Nãããão… que ideia!», publicado no jornal «Público» (pg. 17), e louvo-lhe o desassombro, mas essas preocupações não se aplicam ao exame de biologia e geologia desta manhã, felizmente.
Nos exames nacionais (e no ensino em geral) não precisamos de facilitismo nem de incompetência, que andam ligados. Basta sermos sérios.
Vamos ver o que os resultados deste exame revelam.

José Batista d’Ascenção

quinta-feira, 20 de junho de 2019

Conselhos de turma de avaliação ou de ficção?

Avaliação dos alunos: burocracia e não só.
Fonte da imagem: aqui.
Estão a chegar ao fim as reuniões dos professores de cada turma para avaliação dos alunos. A carga de burocracia é, porém, tão penosa e tão extensa, que se sobrepõe à análise serena e devidamente ponderada do que foi o trabalho e o rendimento de cada aluno. Claro que uma «blasfémia» destas não pode constar dos registos (mais ou menos pomposos, como o «plano curricular de turma», os «planos de monitorização das aprendizagens» dos alunos com dificuldades e, muito menos, nas actas) porque o discurso formal tem uma modulação característica e conformada, ou seja: o «sucesso» tem que ser muito alto (porque o que se pretende é o «sucesso pleno»), de acordo com os objectivos e metas que constam dos «projectos educativos» (outra pomposidade gongórica e vácua a que cada escola está obrigada e redige ufanamente como «carta fundamental», ainda que ignorada, do seu mister). Pelo que os casos de insucesso têm de ser objecto de tantas ou tais medidas dos ditos planos que, se não há «notas» positivas no final do ano, há-de haver responsáveis e não é curial apontar o dedo às crianças nem aos seus encarregados de educação. Nem, obviamente, à falta de diligências e normativos legais das hierarquias, por mais estapafúrdios ou inúteis que sejam. Na ausência de milagres e por não haver autonomia dos professores, por exemplo, dando-lhes a possibilidade de fotocopiarem umas fichas de exercícios na reprografia e concedendo-lhes umas horas, devidamente contempladas no horário lectivo semanal, para trabalho de recuperação individual ou de pequenos grupos de alunos com atrasos muito significativos na aprendizagem de certas matérias, insiste-se na burocracia e na ficção. Muita ficção. E o que se passa com alunos com deficiência (esta palavra é «proibida») acentuada ou profunda, integrados em turmas comuns, como se pudessem ou devessem aprender os conteúdos dos respectivos programas é tão chocante como devia ser inadmissível. Um dia ser-nos-á dito assim, na nossa cara, mas por enquanto ninguém parece admiti-lo.
Uma forma de descer à terra seria desligar a progressão dos alunos da avaliação honesta do que aprenderam e não aprenderam, que é papel dos professores. Se retê-los, na maior parte dos casos, não adianta, o que é verdade, pressionar os professores, de qualquer maneira, para aldrabarem as classificações de modo a que progridam como se tivessem aprendido, também não. Se virmos pelo lado dos gastos, que saem caro, não é crível que traga menos prejuízo económico empurrarmos os alunos impreparados. E em termos de dignidade e decência os ganhos são menos ainda. Ao invés do sentimento de vergonha, tanta quanta restar.
A inflação de notas, incluindo no topo da escala, em consequência de pressões mais ou menos intensas, de discretas a frontais, faz parte da mesma síndrome, por cujas consequências ninguém responde.
Isto porque somos um país dado à ficção, desacreditada embora, particularmente a que tomou conta do «ensino», onde medra(ra)m muitas ocupações e proventos, à volta ou relacionadas com a actividade dos professores que dão aulas.
Ora, estes têm as costas largas e, com frequência, põem-se a jeito.

José Batista d’Ascenção

sexta-feira, 14 de junho de 2019

A última aula do ano lectivo

Imagem obtida aqui. Adaptada.
Às 08.20, não foram mais pontuais do que o costume cerca de metade dos alunos da turma. Mas foram chegando e só um dos lugares permaneceu vazio. No sumário escrevemos: «Verificação dos cadernos diários. Audição da opinião dos alunos sobre o trabalho realizado».
Dois alunos não trouxeram o caderno [de que só ia ver a parte do 3º período], um deles tinha um caderno sofrível, os restantes tinham-no apresentável, sendo que mais de um terço dos alunos tinham um registo muito bom ou excelente das actividades das aulas. Os testes escritos também estavam, em quase metade dos casos, assinados no sítio da rubrica dos encarregados de educação.
As opiniões dos alunos sobre as aulas e sobre si próprios e o seu trabalho, feitas oralmente perante todos, mas respeitando também o direito de cada um ao silêncio, quadravam com o que efectivamente foram fazendo ao longo do ano, com particular incidência no terceiro período. A generalidade dos alunos tem uma noção consideravelmente precisa do seu empenhamento e do rendimento obtido.
Uma das opiniões referiu que o professor devia ser mais tolerante com alguns comportamentos dos alunos. Agradeci sinceramente a franqueza e pedi o esforço de compreensão para que não se confunda tolerância com «toleirância», mal em que se cai, vezes demasiadas, nas nossas escolas. Não me alonguei e pareceu-me não suscitar discordâncias, pelo menos aparentemente… Uma outra opinião, de outro aluno, foi a de que «o professor gosta de ensinar», a qual me soube bem ouvir e que pedi para comentar, do seguinte modo: - Sim, gosto muito das escolas, especialmente da porta da sala de aulas para dentro.
Finda a sessão, desejei-lhes «boas férias», mandei-os arrumar as cadeirinhas e sair. Pouco depois, já na rua, à porta da escola, dirigia-se-me, solícita, a aluna que faltara. Adormecera. - Como vai ser? - perguntava – não lhe mostrei o caderno diário, que tenho aqui – acrescentou. Perguntei-lhe se estava direitinho. Que sim, disse, com um sorriso humilde, de quem pede desculpa. – Vou registar, respondi-lhe. E despedi-me.
Dava dois passos e sentia qualquer coisa como uma imensa ternura ou saudade ou não sei o quê.
Raio de vida. Vá lá eu compreender-me.  

José Batista d’Ascenção

quinta-feira, 6 de junho de 2019

A extravagância de considerar as «aulas tradicionais»(1) importantes

Imagem obtida aqui.
Perdidas, as escolas vão cumprindo com (enorme) dificuldade o que deviam ser as suas funções. O problema radica exactamente no que devem/deviam ser essas funções, seja no entender dos teóricos, das hierarquias, de cada professor ou de cada encarregado de educação. 
Pensam uns que os dispositivos tecnológicos de última versão apaixonam os alunos, o que é genericamente verdadeiro, e que, por essa via, eles aprendem o fundamental, o que carece de demonstração.
Outros reclamam «pedagogias activas», de preferência sem arrumação definida de mesas e cadeiras, com os alunos volantes, mexendo e falando (o que chega a confundir-se com participação nas aulas…) e quase desprezando a concentração e o silêncio e, muito particularmente, a audição atenta e respeitadora do outro: professor ou aluno que intervenha em cada momento.
A variação anterior pode englobar o «trabalho de grupo», não raro apregoado como remédio milagroso, esquecendo que ninguém trabalha bem em grupo se não cumprir certos requisitos pessoais, que são imprescindíveis antes de mais para o trabalho individual.
Há quem seja um adepto ferrenho do «trabalho de projecto», que pode ser muito bom, claro, mas para grupos restritos, e cada grupo trabalhando sobre matéria específica, o que exige disponibilidade de tempo e não só, normalmente incompatível com programas extensos e um número elevado de alunos.
Há também quem se escandalize, mesmo (ou sobretudo) entre os professores, porque há docentes que se atrevem a explicar/ensinar, quando os alunos é que deviam «construir» o próprio saber. Certos pais não vão na onda e procuram, precisamente, explicadores (na escola, às explicações tem de se chamar «apoio»…), pais que, pelos vistos, não se arrependem e recomendam o método…
E há uma nova «moda pedagógica» que é a de considerar que a escola actual tende a funcionar como a escola do século XIX (de resto, muito restrita no Portugal de oitocentos) e que é preciso fazer uma escola do século XXI, seguramente viva, apaixonante e de sucesso pleno (o que se vai conseguindo, em termos estatísticos). Trata-se de um engano, pouco sério e perigoso.
Imagine-se que alguém começava a questionar a música do século XIX: como se fazia, como se executava e como se ouvia, no sentido de considerar intoleráveis as «metodologias» subjacentes na actualidade. Estenda-se a analogia à literatura, ao desenho, à pintura ou à escultura... Seria absurdo.
Com a pedagogia também.
Nos tempos passados, como agora, havia boa e má pedagogia, bons e maus professores (cabe aqui perguntar quem e como habilitou os segundos e quem os seleccionou para ingressarem no ensino). Testemunho com um filme de arquivo da RTP sobre uma aula de campo do Professor Galopim de Carvalho, creio que anterior ao último quartel do século XX. E com as saídas de campo com o Professor Jorge Paiva (às margens do Mondego, à Margaraça, ao Paul de Arzila ou ao Gerês) ou com o rigor e beleza das suas aulas teóricas no velho anfiteatro do Instituto Botânico da Universidade de Coimbra, vai para quarenta anos. Sim, aquilo era e é pedagogia. Então como agora e provavelmente em qualquer tempo.
Que fazer então? Ensinar o quê e como às crianças e jovens?
Não vejo alternativa senão dar (a) autonomia (possível) às escolas, exigir-lhes transparência nas suas metodologias, avaliá-las externamente (sim, com exames, bem feitos e não apenas restringidos a provas escritas) e possibilitar às pessoas a escolha das que julgassem mais adequadas para formar os seus educandos, salvaguardando, tanto quanto possível, o respeito pela liberdade pedagógica e pela dignidade de cada professor.
A confusão reinante é que não convém.

José Batista d’Ascenção

(1) Nos tempos que correm, nos países democráticos, não há «aulas tradicionais». Para o demonstrar bastaria constatar o modo como as crianças estão na sala de aula, e ainda bem. Porém, não raro, e cada vez mais, fazem (mais ou menos) o que querem, com os resultados que conhecemos.