Avaliação dos alunos: burocracia e não só. Fonte da imagem: aqui. |
Estão a chegar ao fim as reuniões dos professores de cada turma para avaliação dos alunos. A carga de burocracia é, porém, tão penosa e tão extensa, que se sobrepõe à análise serena e devidamente ponderada do que foi o trabalho e o rendimento de cada aluno. Claro que uma «blasfémia» destas não pode constar dos registos (mais ou menos pomposos, como o «plano curricular de turma», os «planos de monitorização das aprendizagens» dos alunos com dificuldades e, muito menos, nas actas) porque o discurso formal tem uma modulação característica e conformada, ou seja: o «sucesso» tem que ser muito alto (porque o que se pretende é o «sucesso pleno»), de acordo com os objectivos e metas que constam dos «projectos educativos» (outra pomposidade gongórica e vácua a que cada escola está obrigada e redige ufanamente como «carta fundamental», ainda que ignorada, do seu mister). Pelo que os casos de insucesso têm de ser objecto de tantas ou tais medidas dos ditos planos que, se não há «notas» positivas no final do ano, há-de haver responsáveis e não é curial apontar o dedo às crianças nem aos seus encarregados de educação. Nem, obviamente, à falta de diligências e normativos legais das hierarquias, por mais estapafúrdios ou inúteis que sejam. Na ausência de milagres e por não haver autonomia dos professores, por exemplo, dando-lhes a possibilidade de fotocopiarem umas fichas de exercícios na reprografia e concedendo-lhes umas horas, devidamente contempladas no horário lectivo semanal, para trabalho de recuperação individual ou de pequenos grupos de alunos com atrasos muito significativos na aprendizagem de certas matérias, insiste-se na burocracia e na ficção. Muita ficção. E o que se passa com alunos com deficiência (esta palavra é «proibida») acentuada ou profunda, integrados em turmas comuns, como se pudessem ou devessem aprender os conteúdos dos respectivos programas é tão chocante como devia ser inadmissível. Um dia ser-nos-á dito assim, na nossa cara, mas por enquanto ninguém parece admiti-lo.
Uma forma de descer à terra seria desligar a progressão dos alunos da avaliação honesta do que aprenderam e não aprenderam, que é papel dos professores. Se retê-los, na maior parte dos casos, não adianta, o que é verdade, pressionar os professores, de qualquer maneira, para aldrabarem as classificações de modo a que progridam como se tivessem aprendido, também não. Se virmos pelo lado dos gastos, que saem caro, não é crível que traga menos prejuízo económico empurrarmos os alunos impreparados. E em termos de dignidade e decência os ganhos são menos ainda. Ao invés do sentimento de vergonha, tanta quanta restar.
A inflação de notas, incluindo no topo da escala, em consequência de pressões mais ou menos intensas, de discretas a frontais, faz parte da mesma síndrome, por cujas consequências ninguém responde.
Isto porque somos um país dado à ficção, desacreditada embora, particularmente a que tomou conta do «ensino», onde medra(ra)m muitas ocupações e proventos, à volta ou relacionadas com a actividade dos professores que dão aulas.
Ora, estes têm as costas largas e, com frequência, põem-se a jeito.
José Batista d’Ascenção
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