quarta-feira, 27 de março de 2019

O estudo para os testes feito de enxurrada, em cima da hora

Fonte da imagem: aqui.
A angústia e o «stress» pré-testes terá sido de todos os tempos escolares e afecta a imensa maioria dos alunos portugueses (suponho). Provavelmente, relaciona-se com a nossa maneira de ser e de viver, mas eu sempre pensei que podíamos, com paciência e insistência, mudar o hábito. Porém, se alguma razão me resta, tarda o dia em que se concretize, de facto.
Claro que o estudo devia ser feito dia-a-dia, paulatinamente, nas aulas e fora delas, mas é difícil generalizar tal procedimento.
Ao primeiro impulso, dá vontade de acabar com os testes escritos, mas, aqueles professores que, tendo várias turmas, o puseram em prática, não foram felizes nem ficaram (mais) bem vistos pelos (seus) alunos, impressão que o tempo não diluiu. Pela minha parte, tive outros pensamentos drásticos, como acabar com o agendamento dos exercícios escritos de avaliação, que passariam a ser aplicados em qualquer altura, sem data previamente comunicada aos estudantes. Nunca, porém, me atrevi a executar a ideia, embora várias vezes a tenha referido aos alunos para os fazer sentir a necessidade do estudo contínuo.
Naturalmente, há muitos modos de obter informação sobre o que os alunos sabem e ignoram. No entanto, faça-se o que se fizer, para avaliações equitativas e uniformes, de turmas grandes ou de muitas turmas, não há metodologias mais fiáveis. E se o objectivo é seleccionar alunos em grande número não se conhece alternativa mais eficaz. Tomara eu que o objectivo principal fosse fazê-los aprender, na medida do possível.
Acontece que, da parte de muitos alunos, a barriga farta e a fraca sensibilização para a importância e a beleza do saber, sem falar de questões éticas, conduz a uma certa adaptação à vulgaridade das práticas e dos exemplos, que se traduz em procurar passar os «crivos» de qualquer maneira, incluindo meios ilegítimos de vária ordem, por vezes francamente descarados e… impunes.
E a escola, perdida, envelhecida e envilecida, reproduz e amplia o marasmo em que permanece imersa, década após década, não obstante a deriva frenética e irresponsável de procedimentos inspirados em retóricas sem fundamento (nem gramática) a que chamam… inovações.
Mas ninguém pede que se feche a escola.
E os que nela aprenderam como deve ser sabem bem o valor que tem. Os outros duvido que alguma vez saibam – esse tem sido e é o problema.

José Batista d’Ascenção

segunda-feira, 25 de março de 2019

Boa mesa e bem comer não têm o mesmo significado – a pretexto

Imagem obtida aqui
Seja, falo de mim, exponho-me sem ser exemplo, mas faço-o livremente: gosto de comer com fome, sentado à mesa, em boa companhia, e saborear cada alimento que levo à boca. Mas, quando inicio a refeição, gosto de não demorar muito tempo a deliciar-me com o prato principal. Quando fui assíduo frequentador de cantinas, no ensino secundário e na universidade, até a sopa comia depois dele. Após a sobremesa, se houver, e, sendo possível, prezo um tempo de conversa, sem pressas, sobretudo se os convivas são de feição e o coração está em festa. Nessas alturas, apetece-me parar o tempo: pouco me dá mais prazer do que prolongar a conversa à volta da mesa, se se prestam os comensais, a altura do calendário, o dia, o horário, e as circunstâncias.
Claro que isto me traz algumas dificuldades. É hábito, nos restaurantes e em refeições caseiras mais ou menos festivas, haver tantas «entradas» e tão deliciosas que, ou as comeria a gosto, como numa bela merenda, e dispensaria o prato «pesado» que se seguiria (como já aconteceu), ou me modero e espero por esse prato, cuja hora se arrasta, e nessa altura, algum desconforto não facilita a boa conversa, sendo que, quando o dito prato (finalmente) chega, desatempado e supérfluo, já não me sabe como aprecio.
Naturalmente, disponibilizar grande variedade de «entradas» justifica os preços mais subidos de não poucas casas de pasto, mas nas casas das pessoas o hábito também se generalizou. Tenho dúvidas de que seja comer bem.
Ora bem, se alguém leu até aqui, esqueça o que escrevi antes. Era apenas um pretexto para dizer isto: um dia do final da semana passada houve jantar de festa não efusiva para nos despedirmos da D. Marina, funcionária da nossa escola que concorreu ao abrigo da lei da mobilidade e arranjou trabalho mais bem remunerado. A D. Marina, muito diligente, foi investindo na sua formação, enquanto desembaraçadamente fazia o serviço de reprografia, qualificou-se e agora deixou-nos. Ela e não só, o senhor Dores também partiu, pela mesma via legal. Mas não vieram funcionários substitutos. O remédio foi o habitual: a D. Elisabete, que já dava uma ajuda na reprografia, em alturas mais críticas, passou para a função. Só que não pode fazer o que fazia antes... Consequências:  os longos corredores da escola ficam com falta ainda maior de vigilantes permanentes, o que não é bom nem prudente.
Tivemos, pois, jantar. Um lauto jantar. Mas certa sombra de tristeza não me veio de o bacalhau e a carne chegarem à mesa a hora adiantada para a minha preferência. Nem do grande desperdício em abundância e variedade, quando tanta gente passa necessidades.
Razões outras se sobrepunham.
Felicidades, D. Marina e senhor Dores. E obrigado.

José Batista d’Ascenção

Adenda relevante: Quem também penosamente deixou (mais desfalcada) a equipa da cantina da escola, para lutar contra uma leucemia, foi a D. Júlia Abreu, em tempos referida aqui. Para ela, um abraço e um beijinho de encorajamento, de carinho e de gratidão.

domingo, 17 de março de 2019

Alguns factos reais simples sobre carreiras e vencimentos dos professores

Já este ano lectivo, incumbiram-me de ir a uma escola diferente da minha assistir às aulas de um colega, o qual tem cerca de 40 anos, trabalha como professor há dezassete, está no 2º escalão (de uma carreira de dez, cada um com a duração de 4 anos, com excepção do 5º, que é de 2) e aufere à volta de mil e duzentos euros líquidos por mês.
Das aulas que observei (e foram 4, de 50 minutos cada), ficou-me a grata impressão de que é um profissional bem preparado, científica e pedagogicamente, dedicado e com uma relação com os alunos humana e tecnicamente irrepreensível.
Comigo, na minha escola, trabalha um outro colega e amigo, do mesmo grupo disciplinar, que também está no 2º escalão, e cumpre o 25º ano de serviço!
Ora, estes professores não podem, simplesmente, atingir o topo da carreira.
Interrogo-me: que motivação conseguiria eu, no lugar deles?
O Decreto-Lei n.º 36/2019 de 15 de Março, que «regula o modelo de recuperação do tempo de serviço dos docentes […], cuja contagem […] esteve congelada entre 2011 e 2017», estipula no ponto 1 do seu artigo 2º: «A partir de 1 de janeiro de 2019, aos docentes [...] são contabilizados 2 anos, 9 meses e 18 dias, a repercutir no escalão para o qual progridam a partir daquela data.»
Esta redacção é cheia de artifício. Supondo um professor que se encontre no 9º escalão da carreira (em que aufere um pouco mais ou um pouco menos de mil e oitocentos euros líquidos por mês, consoante a data em que tenha acedido a esse escalão), esse professor vê contado o tempo «descongelado» não agora, mas apenas no escalão seguinte, ou seja, no último da carreira, quando (já) não produz efeito prático (embora produza «efeito» na opinião pública) e, por isso, não lhe traz benefício nenhum.
Assim se fazem as leis entre nós. Mecanismos legais deste tipo são a forma como o poder executivo governa a penúria financeira do país. Reconheça-se-lhes eficácia, embora não inspirem confiança.
A mim resta-me, porém, uma questão: porque é que não é feita legislação igualmente eficaz na prevenção e penalização dos desmandos da banca? E desejavelmente sem truques, apenas de modo claro e… honesto. O legislador conseguiria, seguramente.
Mas era preciso que quisesse.

José Batista d’Ascenção

domingo, 10 de março de 2019

Propriedades da água e suas funções no organismo

A água é o composto químico mais abundante no corpo humano, assim como na generalidade dos seres vivos. Numa pessoa não obesa com 70 kg de peso, cerca de 45 kg são água. Até as partes duras como os ossos e os dentes têm uma percentagem considerável de água (à volta de 20% nos ossos e 2% no esmalte dentário). Nenhuma célula de nenhum ser vivo pode metabolizar sem água. A vida começou na água, há milhares de milhões de anos, e só muito depois colonizou o ambiente terrestre, primeiro nas bordaduras de oceanos e mares e depois no interior dos continentes, sempre exigindo adaptações para a captação e poupança do precioso líquido.
A importância da água para os seres vivos deriva das propriedades das suas unidades químicas, de tamanho infrananométrico, a que chamamos moléculas, as quais lhe conferem funções imprescindíveis na «maquinaria da vida». Cada molécula de água é constituída por um átomo de oxigénio (símbolo O) e dois átomos de hidrogénio (símbolo H), como revela a bem conhecida fórmula H2O.
Molécula(s) de água. Imagem colhida na «Google»
Uma propriedade importante da água resulta da distribuição desigual da carga eléctrica nas suas moléculas. O átomo de oxigénio, que tem um núcleo com maior carga positiva (conferida por oito partículas sub-atómicas, chamadas protões) do que os de hidrogénio (que só têm um protão), puxa mais para si (dizemos que é mais electronegativo) os electrões (com carga negativa) que ligam esses átomos, gravitando ora em volta do núcleo do oxigénio ora em volta do núcleo de cada um dos átomos de hidrogénio. Assim, há, em cada momento, uma «nuvem» de electrões mais densa à volta do núcleo do oxigénio do que em redor dos núcleos dos hidrogénios. Esta assimetria da distribuição dos electrões cria um «excesso» de carga negativa do lado do oxigénio e um «défice» de carga negativa do lado dos hidrogénios. Ou seja, cada molécula de água é um dipolo eléctrico, embora a sua carga total seja zero. Desta maneira, cada molécula de água funciona como um pequeno íman que se dispõe em relação a outras moléculas de água ou quaisquer partículas polares ou carregadas obedecendo à regra: polaridades ou cargas de sinal contrário atraem-se e repelem-se se forem do mesmo sinal.
Da polaridade das moléculas de água resulta outra propriedade interessante do líquido mais abundante na Terra: a sua capacidade de dissolver e transportar dissolvidas (em solução) muitas substâncias, desde que as suas partículas, átomos ou moléculas, apresentem carga ou polaridade. Dizemos, por isso, que a água é um bom solvente, condição que não se aplica a substâncias cujas moléculas sejam apolares ou não carregadas, que designamos hidrofóbicas, como é o caso das gorduras, por exemplo. Ora, nos seres vivos pluricelulares de grandes dimensões, cada célula é uma unidade viva que precisa continuamente de receber materiais diversos, por exemplo nutrientes, assim como precisa de ver-se livre dos lixos que vai produzindo. Esse trânsito de materiais para as células e a partir delas faz-se em muitos casos por dissolução na água do plasma e da linfa. Dito de outro modo: a água é um bom transportador.
Outra propriedade da água, derivada das características da sua molécula, é que é um líquido que absorve ou liberta grandes quantidades de calor sem que a sua temperatura varie muito. Dizemos que tem uma elevada capacidade térmica mássica (outrora, dizíamos que tinha um elevado calor específico). À quantidade de calor que é necessário fornecer para elevar a temperatura de 1 g de água de 14,5 para 15,5 ºC, chama-se caloria. Se for 1kg de água são mil calorias ou 1 Caloria. Inversamente, se a temperatura das mesmas quantidades de água baixar de 15,5 para 14.5 ºC libertam-se 1 caloria ou 1000 calorias, respetivamente. Isto tem grande importância na fisiologia do organismo. Ao metabolizarem, as células produzem calor. Se não fosse a grande abundância de água no nosso corpo, a temperatura elevar-se-ia demasiado (muito acima dos 37º C) e morríamos. Por outro lado, os fluidos do corpo, especialmente o sangue, percorrem as suas diferentes regiões transportando calor das zonas mais quentes para as zonas mais frias, uniformizando a temperatura. Donde, faz sentido alguém com os pés frios tomar uma bebida quente. A amenização das temperaturas nas zonas próximas de grandes massas de água, junto do litoral, com invernos mais suaves e verões menos destemperados, relativamente a zonas do interior dos continentes, deriva do mesmo efeito. Ou seja: a água é um moderador dos climas.
Mas a molécula de água tem ainda outras propriedades. Uma delas é a facilidade com que intervém em reacções químicas, quer como reagente, quer como produto. Sendo água o líquido que banha as células e sendo água o principal componente dentro delas, o metabolismo ocorre no seio da água (dizemos em meio aquoso). Por exemplo, no intestino, a sacarose (açúcar comum) é digerida em dois componentes: glicose e frutose (outros açúcares, mais simples), que podem assim passar para a corrente sanguínea. Pois bem, para essa reacção ter lugar tem que se consumir uma molécula de água. E na maioria das reacções digestivas passa-se o mesmo (são reacções de hidrólise). Noutras reacções, como na «combustão» da glicose, no interior das células, forma-se água.
Não podemos passar sem água. Em cada dia precisamos de repor toda aquela que perdemos na respiração, na urina, nas fezes e na transpiração (e também nas lágrimas, em hemorragias, etc.). Segundo um dito popular antigo «uma pessoa adulta pode aguentar trinta dias sem comer, três dias sem beber e três minutos sem respirar», o que dá uma ideia relativa da importância de cada um daqueles factores. Beber água (limpa) é um acto de saúde e de higiene alimentar. Muitas pessoas idosas, porque o «mecanismo da sede» deixa de funcionar, não bebem e morrem por desidratação. A desidratação pode ocorrer facilmente em pessoas expostas ao sol do Verão durante largas horas, sobretudo se forem bebés de tenra idade.
A água é fonte e condição de vida, em cada organismo e no ambiente. Não temos alternativa a poupá-la e a não a poluir. 

José Batista d’Ascenção