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Professores (menos modernos?) recomendam aos alunos certas matérias de estudo e consulta e a resolução de exercícios, a realizar extra-aula. São o que em tempos se chamou «deveres» ou (que ainda se chama) «trabalhos para casa» (tpc). Há quem os conteste e quem os defenda, entre os pais/encarregados de educação e (naturalmente) entre os professores.
Um destes dias, certo professor verificava a realização dos tpc. E quedou-se perante um aluno que exibia o trabalho realizado no próprio manual da disciplina, nos espaços entre as perguntas, mantendo o livro aberto sobre o caderno diário de registo dos sumários e apontamentos das aulas, igualmente aberto, pelo que era fácil ver que os tipos de letra manuscrita, num e noutro suporte, eram muito diferentes: redondinha e graficamente harmoniosa, a do livro, e muito irregular e rabiscada, a do caderno. O olhar interrogativo do professor encontrou o do aluno, que não revelava qualquer preocupação. O professor decidiu-se então pelas palavras, referindo que o trabalho realizado no manual [provavelmente emprestado por algum aluno de anos anteriores] e a escrita dos sumários não haviam sido feitos pela mesma pessoa. Sem problemas, e sem virar a cara, o aluno começou por dizer que escreve de formas diferentes em alturas diferentes, mas, face à evidência, rápida e descontraidamente passou a outra justificação: a sua explicadora redigira o trabalho ao mesmo tempo que o ia elucidando a fim de lhe facilitar a compreensão.
O professor pediu então ao aluno que levasse um recado à dita explicadora, dizendo-lhe que ela era incompetente e criminosa e, caso cobrasse dinheiro, que era também uma ladra.
Tais vexames não causaram qualquer perturbação visível no aluno, pelo que o professor optou por maior clareza: não acreditava em nada do que ele dissera ou dissesse naquela circunstância, assim como não podia haver explicadores com tal comportamento, motivos por que a batota tinha sido tentada por outrem, presente na sala, frente ao professor.
E nada.
Aquele jovem continuou mais ou menos imperturbável, afivelando um sorriso de não comprometimento, sem sinal de reconhecimento de incorrecção ou culpa e manifestando disponibilidade para participar na aula: ler textos introdutórios, responder a questões e, até, apagar o quadro, no final.
E o professor registou (mais) este caso de adaptabilidade conformante de um aluno cordato e bem disposto, embora de rendimento trágico.
Valores, ética e cidadania hão-de seguramente continuar a ser prática das pessoas (em maior ou menor número), pelo que não haverá risco de que venham a limitar-se a conceitos irreais grafados nos dicionários.
Porém, o problema é comum, dentro e fora da escola, na política, no desporto, nos negócios e na vida social. Será que tem origem nas escolas e (principalmente) nos professores?
Ou não será?
Nota: O professor em causa foi o escrevinhador destas linhas.
José Batista d’Ascenção
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