quarta-feira, 31 de maio de 2017

Escola Secundária Carlos Amarante (ESCA) felicita e agradece formalmente a Maria Portela


Em iniciativa singela, ocorrida esta manhã às 11h e 30 minutos, na ESCA, a Directora do Agrupamento de Escolas Carlos Amarante, Hortense Santos, felicitou e agradeceu a Maria Portela pela sua prestação nas Olimpíadas Portuguesas de Biologia 2017.
Em Julho, a Maria vai representar Portugal  nas Olimpíadas Internacionais de Biologia, no Reino Unido.

José Batista d'Ascenção

sábado, 27 de maio de 2017

Maria Portela (aluna da ESCA) apurada para representar Portugal nas Olimpíadas Internacionais de Biologia 2017

Decorreu esta tarde em Lisboa, no Pavilhão do Conhecimento – Ciência Viva, a cerimónia de entrega de prémios aos dez alunos mais bem classificados na final nacional das Olimpíadas Portuguesas de Biologia 2017.
Maria Soares Marques Figueiredo Portela, aluna do 12º ano da Escola Secundária Carlos Amarante (ESCA) – Braga (a que já havia sido feita referência aqui e aqui), ficou entre os apurados para representar Portugal nas Olimpíadas Internacionais de Biologia, que decorrerão no Reino Unido, em Julho.
Esta nota tem por único objectivo felicitar (mais uma vez) a Maria Portela, porque ela merece muito, embora as palavras não cheguem para traduzir o que sentimos na alma. Nem é orgulho, é mais um contentamento desmedido que não cabe no peito, uma satisfação imensa por uma aluna que é um exemplo de trabalho sério, de aplicação entusiasta em diversas áreas (ela não é só muito boa aluna) e de uma simplicidade e humildade tocantes. E é assim intrinsecamente, agora como antes e, seguramente, no futuro.
Que bom é ser amigo e colega de turma da Maria. Ou apenas frequentar a escola dela. Que bom é ser professor na escola que ela frequenta. E funcionário dessa mesma escola.
O ano está quase a terminar e já quase temos saudades da Maria.
Da Maria que será sempre nossa.
Parabéns, Maria. Parabéns, família da Maria.
E obrigado.

José Batista d’Ascenção

sexta-feira, 26 de maio de 2017

Sobre o que tem sido a evolução da aprendizagem da matemática, pela voz de quem não se ilude com preconceitos e dados falsos – Jorge Buescu

No jornal “Público” de ontem (pg. 54), o Professor Jorge Buescu recorre a dados do ministério da
educação para pôr em evidência o que têm sido os «progressos extraordinários e consistentes alcançados no ensino da Matemática ao longo dos últimos 15 anos» no ensino básico (ao nível dos 4º, 5º e 6º anos) no nosso país, traduzida nos resultados obtidos quer nos exames nacionais quer nos testes internacionais do PISA e do TIMSS. Os dados a que recorre são muito claros e impressivos e rebatem o experimentalismo inconsistente e incoerente da acção dos governos e das suas políticas de educação, baseadas em “teorias” que assentam fundamentalmente em preconceitos e se traduzem no desfavorecimento dos (mais) pobres, os quais, para ascenderem na escala social, precisam, mais do que os outros, de uma escola que os prepare realmente, em vez de os enganar. São suas estas sábias palavras:

«Para muitas das crianças que vivem em zonas economicamente deprimidas e vindas de famílias carenciadas, a única forma de escapar ao círculo vicioso da pobreza é através da escola. Só estudando conseguirão superar o handicap social que trazem. Só com boas qualificações conseguirão um emprego diferenciado. Só com formação exigente conseguirão um nível de vida superior àquele de que partiram.
A única forma de termos uma escola que promova a igualdade e seja motor de ascensão dos menos favorecidos é fazendo dela uma escola competente e exigente, que dê muito mas também exija muito. É um erro achar que nivelar a escola por baixo promove a igualdade, porque todos atingem o mesmo nível. Pelo contrário: perpetua a desigualdade, porque os mais desfavorecidos terão muito mais dificuldades em o transcender.»

Aqui estava alguém que eu veria com bons olhos a desempenhar as funções de ministro da educação, que, em minha opinião, em muitos anos, não tem havido, com excepção do saudoso Mariano Gago e de Nuno Crato (sim, de algumas das ideias e ações de Nuno Crato, que não as de favorecer o ensino privado à custa do ensino e do erário públicos).
Felicito-o e agradeço-lhe. 

José Batista d’Ascenção

terça-feira, 23 de maio de 2017

“O avô e os netos falam de geologia” livro do Professor Galopim de Carvalho, da Âncora Editora, publicado em 01 de Junho de 2017 (1)

Raramente um livro com conteúdo pedagógico, especialmente na área em que lecciono, me provocou um entusiasmo tão fundo e permanente. À medida que o ia lendo crescia o encantamento e a noção clara da importância que pode ter no ensino de muitos assuntos de geologia que, por dever de ofício, tantas vezes maçador e decepcionante, os professores do ensino básico e secundário se esforçam por fazer compreender às crianças e jovens que são os seus alunos. Escrevi que “se esforçam por fazer compreender”, na intenção de que seria bom que conseguissem fazê-los realmente compreender e, mais do que isso, que fossem capazes de os entusiasmar em tantas matérias de que eles não gostam porque, simplesmente, não estão em condições de as olhar com olhos de ver, pois que, em relação a elas, não lhes foi despertado o gosto, nem a curiosidade, nem o interesse, nem a atitude para o conseguir.
Sendo assim, a culpa é dos professores? Não, não sou dessa opinião, até por conhecer a escola, há longos anos, ininterruptamente. Mas não ilibo os docentes de um certo conformismo obediente (concordar nunca foi obrigatório) a ditames absurdos do ministério, a “teorias” pseudo-científicas de quem não dá aulas, a opiniões de “especialistas” diversos que procuram protagonismo (e proventos) com as desgraças da escola, à burocracia a que se apegam, complicam e multiplicam, ao seguidismo acrítico de conteúdos e sugestões metodológicas programáticas impraticáveis ou erradas, e ainda por cima de aplicação geral (o programa de ciências naturais de 7º ano de escolaridade, que incide sobre geologia, é disso exemplo) e à complacência com exames com perguntas mal concebidas e formuladas, com critérios de classificação subjectivos ou discutíveis, e desfasados dos programas, que, sendo como são (o de biologia e geologia de 10º ano, na parte de biologia, é outro exemplo infeliz, não sabendo eu no que mais se distingue: se em dificultar que os alunos aprendam ou se em impedir que os professores consigam ensiná-los), nem sequer são, para efeitos de exame, devidamente respeitados. Feita esta “mea culpa” colectiva, porque também sou professor, voltemos ao livro.
Este livro, de concepção muito original, faz uso de uma linguagem simples, clara e cientificamente rigorosa. O professor Rui Dias, no prefácio, ilustra exemplarmente a importância real deste facto. Recurso muito usado pelo autor, tanto quanto é desprezado na docência, é a “dissecação” de palavas, termos e conceitos na sua raiz etimológica, de forma elegante, oportuna e feliz. As situações imaginadas para expôr as ideias subjacentes aos conteúdos são de mestre, pela clareza e intuição associadas, sem perda de rigor intrínseco e sem cair na “ganga folclórica” de efeito inútil ou contraproducente: é assim no exemplo de abraçar as mantas da cama, quais camadas sedimentares, juntando-as dos lados para o centro, com formação de dobras para cima e para baixo, que passam a representar os topos de montanhas expostas à erosão e as respectivas raízes, onde o aumento da pressão e da temperatura desencadeiam fenómenos de metamorfismo ou de anatexia; é assim também quando, à volta de uma mesa comprida, uma pancada seca, com a mão, num dos extremos do tampo rígido faz propagar vibrações, de tipo sísmico, menos sentidas à medida que for maior a distância ao ponto de origem, de onde se libertaram…, etc. A simplicidade das explicações chega a dar a ideia de extrema facilidade de apreensão dos conteúdos, o que é ilusório, porque a razão da eficácia do segundo aspecto é a qualidade do primeiro e não o contrário. Em pedagogia, o mais fácil é complicar, simplificar com rigor é muito difícil e não está ao alcance de qualquer pessoa: é preciso saber muito, amar o conhecimento, gostar de ver alguém aprender, não matar a curiosidade de quem aprende, estimular a sua capacidade e aumentar sempre e cada vez mais o seu entusiasmo. E estar disponível para a própria auto-aprendizagem e correcção da metodologia.
Então, este livro é (ou pode vir a ser) um milagre? Não. Os milagres só existem se os fazemos, normalmente com muito esforço e, não raro, sem ganhos materiais para quem ensina. Mas esse é o papel dos professores. E eles sabem que as vitórias que alcançam moram sobretudo no fundo ignoto do peito, às vezes tão grandes quanto desconhecidas, o que em nada as diminui, enquanto compensação afectiva imediata e perspectiva de fecunda frutificação no futuro. Ora, um livro, para produzir qualquer efeito tem, necessariamente, que ser lido. “O avô e os netos…” também é assim. E pôr os alunos a ler um livro, nos tempos que correm, não é tarefa fácil nem pequena. Calma, porém. Com a arrumação dos temas por capítulos, em que cada um pode ser lido sem precedência, a propósito de qualquer dos assuntos em estudo, nenhum deles com extensão excessiva, e constituindo diálogos muito bem arquitectados, que integram a linguagem das crianças, a sua leitura torna-se fácil e muito agradável, de tal forma que eu lembro-me daquele ditado de quando era menino, sempre que não tinha apetite, e me diziam que «comer e coçar é só começar». Tenho para mim que muitos jovens, começando a ler, vão continuar a ler, sobretudo se houver quem vá estimulando, o que pode ser outra virtude – tão conveniente! – do livro.
Mas este livro não se destina apenas a crianças e jovens, ele será útil a qualquer pessoa que o queira ler e, sobretudo, terá proveito para os professores do ensino básico e secundário que leccionam temas de ciências da natureza, geologia ou geografia, quer pelo enriquecimento cultural que proporciona, quer pela obtenção de conhecimento específico, quer pelas metodologias pedagógicas que exemplifica e sugere. Por isso, este livrinho - uso este termo por uma questão de carinho, mas também porque o seu peso e volume não fazem dele um desconfortável “tijolo” - minimiza o risco de afugentar os mais “alérgicos” à gostosa fruição da leitura e da aprendizagem.
Nota que também cabe na apreciação desta obra é a ternura que inspira quando põe em diálogo um avô, real, com os seus netos, também reais, mas que podem ser multiplicados por todas as crianças e jovens e menos jovens de Portugal. Perpassam do início ao fim genuínas vontade e generosidade de contribuir para um melhor ensino nas nossas escolas, de um modo elegante, delicado e comovente, tão firme na sua funda intenção, quanto nobre e belo e… terrivelmente necessário.
O autor é uma pessoa extraordinariamente humilde, tão terra-a-terra, que pediu a este escriba, obscuro professor do ensino secundário, que lhe lesse o esboço à medida que a gestação da obra ia progredindo. Foi assim que, surpreendido e atarantado com a solicitação, primeiro, e deslumbrado a seguir, logo que lidas as primeiras linhas, nunca me convenci, nem então nem agora, de que a minha acção tenha sido verdadeiramente útil, porque tudo me parecia bom e belo e eficaz para a função que pode e deve cumprir. Mas a responsabilidade dessa função já não pode caber a Galopim de Carvalho. Ele dá-nos a água e a cana de pesca e ensina-nos a pescar, e ainda nos dá o primeiro peixe. E também nos mostra o exemplo da sua vida, do seu profissionalismo e da sua acção cívica.
Não há mais que lhe pedir. Só a agradecer e aproveitar, preferencialmente, dando muito e bom uso ao material que põe à nossa disposição.
Parabéns!, e um grandíssimo obrigado.

José Batista d’Ascenção

(1) O título deste texto foi ligeiramente alterado em 12 de Setembro de 2017, para republicação na rede social "Facebook"

segunda-feira, 15 de maio de 2017

Sobre a participação de alunos da Escola Secundária Carlos Amarante (ESCA) – Braga na final nacional das Olimpíadas Portuguesas de Biologia 2017

Conforme registado em texto anterior, no passado dia 06 deste mês de Maio tiveram lugar na Universidade de Trás-os-Montes e Alto-Douro (UTAD), em Vila Real, as provas da final nacional das Olimpíadas Portuguesas de Biologia, versão senior, em que participaram os alunos da ESCA João Ricardo Alves Coelho e Maria Soares Marques Figueiredo Portela.
A aluna Maria Soares Marques Figueiredo Portela ficou entre os 10 primeiros classificados do 12º ano das Olimpíadas Portuguesas de Biologia 2017. A cerimónia de entrega dos prémios terá lugar no próximo dia 27 de maio de 2017 pelas 15:00 h no Pavilhão do Conhecimento – Ciência Viva, em Lisboa.
A posição final da Maria Portela na classificação geral só será conhecida nessa cerimónia. A classificação final será posteriormente colocada no sítio da internet das OPB2017.

Está de parabéns a Maria Portela pelo resultado agora obtido, que se soma ao que o ano passado já havia alcançado (ver imagem e legenda).

O Coordenador José Matos com as estudantes portuguesas apuradas (o ano passado) para representar Portugal nas Olimpíadas Internacionais de Biologia (IBO) no Vietname de 15 a 25 de Julho de 2016. A Maria Portela é a da direita. Por impossibilidade de agenda da Maria Portela, optou-se por ela ir representar Portugal nas Olimpíadas Ibero-americanas de Biologia (OIAB) no Brasil de 11 a 17 de Setembro de 2016, em que obteve uma medalha de prata para o nosso país.

Merecem reconhecimento a Maria Portela e o João Ricardo por terem atingido a final nacional de 2017 entre tantos participantes, de tantas escolas, nas anteriores eliminatórias.
Têm motivos de regozijo os pais, os amigos e os colegas de escola da Maria e do João pelo percurso que ambos fizeram.
Está de parabéns a comunidade da ESCA por ter alunos como a Maria e o João, assim como o estão, e de modo particular, os professores que lhes ensinaram/ensinam biologia.

Um grande obrigado, Maria e João. 

José Batista d’Ascenção

O que é mau (ou está mal) nunca muda no sistema de ensino em Portugal: nasce cresce e permanece, permanece, permanece…

No dia 22 de Setembro de 2003, o jornal «Público» (nº 4932) dava à estampa uma carta minha (pág. 5), intitulada «Novos programas do 10º Ano», de que transcrevo os seguintes excertos:
«Apresentados como mais adequados à realidade escolar, pressupondo um modelo educativo centrado nos alunos, os novos programas do 10º ano, (…) são muito peculiares ao nível da filosofia, da linguagem, dos objectivos, dos conteúdos e das metodologias, sem serem propriamente originais… Acertámos finalmente no alvo? É duvidoso, mesmo considerando um por um qualquer daqueles aspectos.
Restrinjo-me à parte de Biologia, do programa de Biologia e Geologia, por uma questão de delimitação e de legitimidade crítica profissional. Os conteúdos distribuem-se por unidades com um arranjo e sequência artificiais e arbitrários.
(…)
Situação que me causará dificuldade, dentro de poucas semanas, é a sugestão metodológica: “montagem de dispositivos experimentais com seres aeróbios facultativos (ex: Saccharomyces cerevisiae) em meios nutritivos (massa de pão, sumo de uva…) com diferentes graus de aerobiose” (unidade 3). Ora isto é um erro!, que o programa propõe e os manuais reproduzem. Há, porém, muitos especialistas em biologia de leveduras, por exemplo no Departamento de Biologia da Universidade do Minho ou no Instituto Gulbenkian da Ciência, em Oeiras, que, com credibilidade insuspeita, podem confirmar que a Saccharomyces. cerevisiae (levedura do fermento de padeiro) fermenta sempre que haja abundância de glucose no meio (como no sumo de uva ou na massa de pão), independentemente da disponibilidade de oxigénio (grau de aerobiose). Nesse caso, a respiração aeróbia é inibida a vários níveis, apenas sendo activada quando as leveduras estão esfomeadas e dispõem de oxigénio, fenómeno conhecido como Efeito de Crabtree.
Torna-se por isso ingrato lidar com programas e manuais que recomendam profusamente procedimentos e metodologias de análise e experimentação e adiantam resultados tais que não podem corresponder a realidades experimentais devidamente executadas e controladas. E que redundam em “formatação” errada dos alunos…
Sem espaço, e com tanto para pôr na carta, deixo a pergunta: deveríamos preocupar-nos em ensinar matérias específicas, claramente apresentadas e muito bem definidas, ou devemos valorizar a forma e os processos, em detrimento do conteúdo, sob o argumento de que a verdade em ciência é construída e vai variando?
Para onde vamos? O nevoeiro é imperativo.»

Dias depois, com carimbo de 26. 9. 03, recebi na escola onde trabalho, em Braga, via CTT, uma carta da Professora Maria da Conceição Loureiro Dias, do Instituto Superior de Agronomia da Universidade Técnica de Lisboa, com o texto de um “email” que antes me enviara, sem sucesso, e que reza o seguinte:

«Fiquei encantada quanto ontem encontrei a sua carta no Público!
Eu não estou a par dos disparates do programa do 10º ano, mas acho muito positivo que apareça um professor a fazer valer os seus conhecimentos científicos para chamar a atenção dos cidadãos para os erros que se cometem na sua área de ensino.
É muito interessante a sua chamada de atenção para o efeito de Crabtree. Esta é daquelas experiências que nunca correm bem, por motivos com muito boa explicação científica, mas em que o peso da falta de criatividade e de conhecimentos continua a vencer na feitura dos programas.
(…)
Muitos parabéns pela sua coragem em querer fazer melhor!
Com toda a amizade.
Conceição Loureiro Dias»

Mas, o que vale tudo isto? Eu respondo: nada!
Para o Ministério da Educação e para o Instituto de Avaliação Educativa, I. P. (IAVE) não se passou nem se passa nada. Para confirmação consulte-se o livro “Questões de exames nacionais (11º ano) e de testes intermédios (10º e 11º anos) 2006-2013. Com resoluções. Ensino Secundário. Volume II – Biologia. 1ª Edição: Janeiro de 2014.” e veja-se o exercício 16 da página 65 e a respectiva resposta que consta na página 261. Este livro é um manual de exercícios editado pelo Ministério da Educação e Ciência e pelo IAVE.
Fermentação/Respiração aeróbia em Saccharomyces cerevisiae - a experiência mentirosa.
Este é (continua a ser) o panorama. Nesta matéria, que voltei a leccionar há não muitos dias, dói-me ensinar bem os alunos, desmontar o que aparece nas provas do IAVE (exames nacionais), nos manuais e em exercícios disponibilizados por algumas editoras, e depois pedir-lhes a máxima atenção para a eventualidade de, em exame, terem que responder errado para que as suas respostas sejam consideradas certas!
Que (mais) pode um professor fazer?

José Batista d’Ascenção

quarta-feira, 10 de maio de 2017

O AVÔ E OS NETOS FALAM DE GEOLOGIA

É já no próximo 1 de Junho, dia da abertura da Feira do Livro de Lisboa, 2017, o lançamento deste meu  último livro, da Âncora Editora.
Embora o título sugira uma obra destinada a juvenis, “O AVÔ E OS NETOS FALAM DE GEOLOGIA”, escrito em estilo de diálogo, foi concebido a pensar nos Professores que ensinam Geologia nas nossas Escolas, nos seus alunos e, ainda, na generalidade dos leitores interessados em descobrir a maravilhosa história do nosso Planeta. Esta realização nasceu da experiência que mantive e continuo a manter, proferindo lições por todo o país e em todos os níveis, do Básico ao Secundário e, até, nos Jardins-Escolas. Sem perda de rigor científico, criei e aprendi a usar o discurso pedagógico mais adequado a cada um destes níveis. E é esse discurso que coloco aqui à disposição dos leitores.

ÍNDICE

Introdução
Agradecimentos
É preciso descodificar as palavras.
O nascimento do Astro-rei.
A estrela que nos deu e nos assegura a vida.
O nascimento da Terra.
Lua, a nossa companheira.
Pedras caídas do céu.
“Planeta azul”, a nossa casa.
À semelhança de uma cereja.
Viagem ao centro da Terra.
A pele da Terra.
Para baixo todos os santos ajudam.
Pesamos mais na praia do que na montanha.
Pesamos mais nos Açores e na Madeira do que no Continente
Como na banheira de Arquimedes.
Coisas que é preciso saber para falar de minerais.
Outras coisas importantes para falar de minerais.
E tudo o mais que se aprende ao falarmos de minerais.
Rochas ou pedras?
As rochas que nasceram de um magma.
Dos sedimentos às rochas sedimentares.
O que são e como nascem os calcários.
Quando as rochas se afundam na crosta.
Um sobe e desce de centenas de milhões de anos.
As bocas do Inferno.
Há vulcões e vulcões.
E o que mais se pode dizer sobre vulcões.
Aproveitar o calor da Terra.
Quando a Terra treme.
Duas maneiras de classificar os sismos.
Quando as vidas se transformam em pedra.
O tempo em geologia.
Dinossáurios no Centro Ciência Viva de Estremoz.
Dinossáurios na estrada.
Inalar o ar que os dinossáurios respiraram.
Jangadas de pedra.
Porque é que se diz “tectónica de placas”?
O motor da tectónica de placas.
Um íman do tamanho da Terra.
O chão que nos dá o pão.
Se não houvesse solos, nós não estávamos aqui a falar.

INTRODUÇÃO

Naquele Verão, era quase sempre com o Sol a descer para lá do Oceano, que o avô falava das muitas coisas que haviam preenchido o seu mundo como geólogo e professor de geologia. Sob o alpendre coberto de hera, no pequeno terraço anexo à casa, uma grande mesa com tampo de ardósia, onde se podia escrever com giz, e algumas cadeiras eram o centro preferido para estas conversas com os três netos. Liberta a mesa de tudo o que servira o jantar, o Domingos e os gémeos Francisca e Mateus, rodeando o avô, tinham nos olhos o brilho da curiosidade. Mais velho, o Domingos, terminara o 7º ano de escolaridade. O Mateus e a Francisca tinham concluído o 6º. O tempo de férias era agora todo deles, com praia pela manhã, jogos e leituras, dentro de casa, nas horas mais quentes da tarde e aquele apetecido convívio ao fim do dia, que os conduzia a maravilhosas viagens e aventuras. 
Embalados nas palavras do avô, “caminhavam” sobre rochedos em altas montanhas, “corriam” no solo fofo das estepes e pradarias, “pisavam” o chão áspero e duro dos vales secos e gélidos da Antárctida, “respiravam” a humidade quente e perfumada da floresta amazónica, “mergulhavam” nas profundezas do oceano e “nadavam” nas águas tropicais, límpidas e mornas, por entre corais e peixinhos de todas as cores. Ouvindo as histórias que o avô contava, “subiam” ao topo de vulcões jorrando lavas incandescentes ou projectando nuvens imensas de cinza, “escorregavam” nas dunas escaldantes no deserto do Sahara ou “percorriam” grutas repletas de cristais e imaginavam-se entre dinossáurios e muitos outros animais desaparecidos.
Encorajado pelo interesse e pela atenção dos netos, o avô não parava de falar. Paisagens que percorrera, profundas minas a que descera, museus que visitara, grandes figuras que conhecera e episódios que vivera ou presenciara eram condimentados com ensinamentos nos domínios em que trabalhara e que, ao mesmo tempo, estivessem entre as matérias constantes dos programas escolares destes três elementos do seu pequeno e interessado auditório.
E era tudo tão agradável e entusiasmante. Ouvir o avô era como ver um filme ao lado de alguém que explicava e tornava fácil o que parecia difícil de entender. A cada passo, as novas palavras necessárias ao discurso iam sendo descodificadas, “traduzidas por miúdos”, como dizia o avô, ganhando significado. 
Eis o primeiro dos 33 capítulos

É PRECISO DESCODIFICAR AS PALAVRAS

A tarde estivera particularmente quente e foi ainda no final do jantar, servido na mesa do terraço, enquanto saboreava o gelado trazido do supermercado, que a Francisca perguntou ao avô qual seria o assunto da primeira das conversas prometidas, a terem lugar ali, à semelhança do que acontecera nas férias de verão do ano anterior. Seria, certamente, mais uma daquelas lições, dadas num jeito de contar histórias, que dava gosto ouvir.
- Nas conversas que vamos ter este ano, - começou o avô - acho que vou começar com algumas reflexões sobre as palavras que irão ouvir, muitas delas novas e sem significado, se não forem convenientemente explicadas. Mas antes gostava que ouvissem o que me parece importante dizer sobre a palavra.
- Diga avô. Adiantou-se o Mateus.
- Chegada a nós através do latim parabola, que significa discurso ou fala, a palavra é uma característica exclusivamente humana, que nos distingue dos restantes animais a que, de um modo demasiado simplista, adjectivamos de irracionais. Sabemos hoje que este nosso dom reside nos escassos pontos percentuais que nos distanciam do código genético do chimpanzé. Vamos, pois, aproveitar esta capacidade e fruir os bens que o saber nos oferece. 
- Quem fala assim não é gago! – exclamou a neta, olhando o avô com um lindo sorriso.
- Enquanto falada, a palavra é um conjunto de sons que define um ou mais objectos ou ideias. Os estudiosos destas matérias admitem que o andar de pé, ou seja, a postura erecta dos primitivos humanos, a libertação das mãos (especialmente adaptadas à vida nas árvores pelos seus antepassados primatas) e a utilização destas no talhe e no uso de instrumentos conduziram ao aumento de volume do cérebro e ao seu desenvolvimento em termos de complexidade. 
Já ouvi falar em primatas, - interrompeu o Mateus – mas não sei bem o que são.
- Primatas, meu neto, são os animais de um grupo de mamíferos que tu conheces muito bem. São, entre outros, os macacos, os chipanzés, os gorilas, os orangotangos e os seres humanos.
- Obrigado, avô.
- A possibilidade física de emitir mensagens sonoras, aceites como rudimentos de palavras, - Acrescentou a avó, aproximando-se. - isso pressupõe a aquisição de uma capacidade intelectual e de uma outra, física, ao nível do aparelho fonador, ou seja, da boca, da garganta e do nariz, susceptíveis de expressar ideias através de emissões de voz. 
- Essa possibilidade – retomou o avô – pode ter surgido quando os nosso primitivos antepassados começaram cooperar entre si, adaptando formas de comunicação baseadas, não só em expressões da cara e em gestos, mas também nas citadas emissões vocais. 
- Impossíveis de confirmar. - Acrescentou o pai das crianças, atento a uma conversa do seu particular interesse. - As opiniões sobre o início desta etapa da evolução dos nossos antepassados, isto é, da hominização, variam entre as que a aceitam associada ao aparecimento do género humano mais antigo, há cerca de 2.500.000 anos, às que a apontam como uma conquista do homem moderno, há menos de 100.000 anos. 
- Usada com marco divisório entre a Pré-história e a História, - continuou o avô - a palavra escrita é um conjunto de símbolos gráficos ou grafemas susceptíveis de exprimir uma e, por vezes mais, ideias, registados num suporte material como foi o barro e a pedra, na Antiguidade, e o papel e o electrónico, etc., no presente. Na nossa cultura, em que a grafia é alfabética, podemos converter a palavra escrita em sons ou grupos de sons que reproduzem a palavra falada. 
- Deixe-me só acrescentar – pediu o pai das crianças – que a palavra escrita surgiu há cerca de 5000 anos, na Mesopotâmia, acredita-se que por engenho dos sumérios, desenvolvendo-se como uma outra via de comunicação.
- Que, embora de uso muitíssimo mais restrito, - acrescentou o avô - possibilitou ao homem divulgar os seus conhecimentos muito para além do seu espaço geográfico e do seu tempo. 
- São múltiplos os factores envolvidos na criação deste passo importante na civilização e, com isto termino, - disse o pai - um deles foi o surgimento das cidades, como exigência do progresso da economia e da sociedade. 
- Vamos, então, começar pelo significado das palavras. Todos se acordo? 
- Sim, avô. – Disseram, quase ao mesmo tempo, a Francisca e o Mateus.
- E eu também. – Disse, logo a seguir, o Domingos.
- Uma grande verdade que eu aprendi em quarenta anos de professor e muitos mais como divulgador de ciência a todos os níveis, é que «o discurso do professor tem de ser simples, sem perda de rigor, apelativo e, sempre que possível, agradável». Só assim o aluno ou quem o escuta ou lê tem gosto em aprender e aprende.
- É como faz o avô. A gente aprende logo. Quase que não precisa estudar. – Disse este neto.
- Todas as actividades, sejam elas quais forem, das mais simples às mais complicadas, precisam de palavras para dar nomes a todas as ferramentas ou utensílios de que se servem e a tudo o que nelas se faz ou produz. Por exemplo, os cozinheiros servem-se de facas, tachos e panelas, fritam, cozem e assam. Os alfaiates e as costureiras mexem em tesouras, agulhas, linhas e botões, fazem casacos e vestidos e falam de lã, algodão, seda e linho. Todos eles usam palavras que toda a gente conhece, mas também usam outras que nós nem pensamos que existem. Passa-se o mesmo com os médicos, os economistas, os juristas e todos os cientistas e técnicos dos mais variados ramos. Também eles falam de nomes do dia-a-dia de toda a gente, mas atiram-nos à cara muitos outros que só eles e muito poucos entendem. Em suma e simplificando, tudo o que se pensa ou faz e tudo em que se mexe tem um nome. Com a geologia é a mesma coisa. Além das palavras vulgares esta ciência que estuda a Terra criou as suas próprias palavras. 
- É mesmo isso. – Interrompeu o neto mais velho. - Quando o avô ou a minha professora falam de coisas da geologia, aparecem sempre palavras novas.
- Os cientistas estão sempre a descobrir coisas novas e, assim têm de criar neologismos. Aqui têm os meus netos, uma palavra que vem mesmo a calhar. Neologismo é o nome que se dá a uma palavra criada de novo e que foi feita a partir dos elementos gregos, neo, que quer dizer novo, e logos, que significa estudo, conhecimento.
- Então, temos de aprender grego? – Perguntou o Mateus com ar de alguma preocupação.
- Não. Basta que saibam o significado dos termos que entram na composição dos vocábulos próprios das disciplinas que têm de estudar. Uns vêm do grego, outros do latim.
- Vocábulos, Avô? – Interrompeu, de novo, o Mateus.
- Aí tens tu uma palavra tirada do latim vocabulu que quer dizer nome de uma coisa. Mesa, copo, lápis, areia, piscina, mar e todos os nomes que conheces e não conheces são vocábulos. Entre os vocábulos usados em geologia, por exemplo, há palavras que toda a gente conhece, como montanha, rocha, areia, erosão, mina, vulcão, e palavras só usadas pelos profissionais, como turbitito, gliptogénese, anatexia, piroclasto, orógeno, hialoclastito e muitíssimas outras, em número de centenas. São nomes que, de momento, nada vos dizem e que, a seu tempo, poderão vir a conhecer.
- E são essas que vamos aprender? – Perguntou o Domingos.
- Por agora nem todas, mas, mais tarde, certamente que sim. - Continuou o avô. - Eu costumo dizer que são palavras “caras” que é preciso “trocar por miúdos”. No século XVIII, quando as ciências começaram a ganhar importância, estudar e criar conhecimento era uma actividade, praticamente, só exercida no seio do clero, por padres e monges, e também por alguns representantes da nobreza. O latim e o grego faziam parte das disciplinas habituais no ensino a que, nesse tempo, só estas classes tinham acesso. O povo, dizia-se, não precisava estudar. Bastava-lhe a força dos braços e a habilidade das mãos. Estava-se muito longe de o ensino ser obrigatório para toda a gente. 
- A cabeça do povo era só para pôr o chapéu ou o barrete. - Entrou na conversa a avó, atenta à conversa. – O clero e a nobreza sabiam muito bem que os seus privilégios assentavam na ignorância do povo. 
- E fiquem a saber - acrescentou a mãe das crianças, atenta a esta conversa - que, mesmo depois e por muito tempo, estudar era uma actividade só acessível aos homens. As mulheres não tinham essa possibilidade. Serviam para tudo menos para estudar. Estavam destinadas a serem boas esposas, boas mães e boas donas de casa. Ainda pouco na geração da avó, mas depois, felizmente, na minha, as raparigas já puderam estudar lado a lado com os rapazes. 
- Era como ainda hoje em algumas sociedades dominadas por fundamentalistas religiosos, em que as raparigas estão proibidas de ir à escola. – Lembrou a avó. 
- Hoje, nas nossas escolas, - continuou a mãe das crianças - praticamente, ninguém estuda latim ou grego. Só na Universidade e, mesmo assim, são poucos os alunos que frequentam estas disciplinas. O latim que os romanos falavam já não se fala em parte nenhuma, nem em Itália. E o grego que se fala na Grécia já sofreu grandes alterações.
- Bom, mas continuemos. - Interrompeu o avô. - Os cientistas têm de dar nomes às coisas que vão descobrindo ou, por outras palavras, como já dissemos, têm de criar neologismos. E, respeitando a tradição, fazem-no a partir de nomes que vão buscar a essas duas línguas da Antiguidade. São palavras que, praticamente, só eles e os seus pares entendem.
- E geologia é outra dessas palavras, não é, avô? – Disse o Mateus.
- Aí temos nós mais um bom exemplo para começar. – Continuou o avô. - A palavra geologia foi feita juntando dois elementos também de origem grega, geo, que significa Terra, e logos, que quer dizer estudo, conhecimento. Geologia é hoje uma palavra conhecida de muita gente mas, no século XVIII, quando foi introduzida com o significado que lhe damos, só os mais eruditos a conheciam.
Eruditos, Avô? Isso é outra palavra cara? – Perguntou o Mateus, a rir.
- É uma palavra que fomos buscar ao latim eruditu e que se aplicava a uma pessoa que sabia muito. E quem diz geologia diz muitas outras. Por exemplo, a palavra cassiterite, nome que foi dado ao mineral de estanho que podem ver aí na colecção que o Domingos começou a fazer, teve origem no grego, kassiteros, que significa estanho, e a que se acrescentou o elemento ite com que terminam os nomes da maioria dos minerais.
- A minha professora também explica as palavras mais esquisitas. - Disse o Domingos.
- À medida que formos falando de geologia – continuou o avô - iremos sempre explicando como nasceram as novas palavras que forem aparecendo, o que torna fácil tudo aquilo que parece difícil. Se souberem o significado dos elementos de que são feitos os nomes que forem aprendendo, eles passam a fazer uma parte sólida do vosso conhecimento.
- Diga mais palavras dessas. Avô. – Pediu a Francisca.
- Digo só mais uma que iremos usar muitas vezes,
- Diga, avô. – Entusiasmou-se a neta.
- Litosfera, que é o nome que se dá à camada exterior da Terra, toda ela formada por rochas. Analisando esta palavra verificamos que, também ela, foi feita juntando dois nomes gregos: lithós que significa pedra ou rocha, e sphaira que, está-se mesmo a ver, quer dizer esfera.
- Assim, fica tudo mais fácil. Obrigado, avô.
- Por hoje já chega. Para terminar, vamos meter bem na cabeça que todos os vocábulos que ouvirmos ou lermos, à medida que formos avançando no nosso estudo, têm de ser explicados. Se não tivermos este cuidado, não passam de palavrões sem significado que decoramos para podermos responder no exame e que, depois, se esquecem para sempre. E agora vão brincar um bocadinho, antes de irem para a cama.

A. M. Galopim de Carvalho

Publicado por José Batista d'Ascenção