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O que é um bom professor hoje? Alguém suporá que haja consensualidade na ideia do que é um professor competente? É aquele que sabe muito (mais do que os alunos) e (que os) ensina bem? É alguém que, mais do que ensinar, proporciona situações de aprendizagem que conduzem os alunos à descoberta do saber? É o que concebe e/ou acompanha projectos em que os alunos constroem o (seu próprio?) conhecimento? Ou quem fomenta a auto-aprendizagem de crianças e jovens, sem os contrariar e por quaisquer meios? O professor pode ser qualquer pessoa que (supostamente) domine «técnicas de ensino» ou é imprescindível que conheça largamente e a fundo as matérias que lhe compete leccionar? E os alunos podem aprender bem algo que não tenha definição enquanto conteúdo ou técnica ou procedimento? Ou, dado o volume de coisas que convém saber e a (aparente) facilidade de acesso ao conhecimento, é necessário que aprendam antes a «aprender a aprender»? E se esta última pergunta for válida, não é igualmente legítimo perguntar se devem aprender a “aprender a aprender”?…
Na era em que todas as respostas estão aparentemente à distância de um «clique», há quem advogue que os professores são dispensáveis. Se esta ideia fosse verdadeira, por motivos lógicos, as escolas, tal como as conhecemos, deviam ser encerradas.
Porém, até ver, mesmo em situações de desprestígio e descrédito da função docente e de desvalorização dos professores, como acontece em Portugal, ninguém propõe medida tão extrema.
Por outro lado, sabemos que há profundas desigualdades socioeconómicas e culturais entre os portugueses, que limitam sobremaneira as possibilidades de aprendizagem de muitas crianças (não esquecer que 20% dos portugueses são pobres e que abundam as condições de miséria, material e não só, que causam a desestruturação de muitas famílias). Porque é que os pedagogos não reclamam aos políticos a atenuação deste problema, que vem antes dos outros?
Naturalmente, se os resultados da aprendizagem são fracos, a formação e selecção de professores deve (devia) ser profundamente (re)pensada. Que (outros…) requisitos devem ser exigidos para aceder à profissão de professor? Qual é a qualidade exigida (ou que deve exigir-se) às entidades que formam professores e à preparação (formação, de raiz e contínua) que ministram? Qual é o grau de autonomia e de consequente responsabilização que deve ser atribuído ao professor? E qual é o papel e o estatuto dos técnicos que acompanham os alunos com problemas e limitações sérias de aprendizagem: devem ser professores especializados, que lhes ensinam o que eles estejam em condições de (poder) aprender, ou são mais uma fonte de exigência formal perante os professores, que não podem operar milagres, e uma peça do «puzzle» de artificialismo ilusório que faz (literalmente) de conta que muitos desses alunos aprendem o que consta dos currículos comuns?
À deriva num mar de incertezas, incapazes de definir balizas eficazes e de prevenir/resolver realmente os problemas, os decisores enveredam por mezinhas folclóricas que pretendem adoçar com estatísticas construídas a preceito. A chamada «flexibilidade curricular» vagueia nessa indefinição. As «aprendizagens essenciais», idem: veja-se o caso de «biologia e geologia» de 10º e 11º anos: há matérias dos programas que deixaram formalmente de ser «essenciais» e há um ou outro acrescento de matérias «essenciais» ao que estava definido nesses programas. Ora, o ministério solicita ao IAVE (Carta de Solicitação ao IAVE, I.P. n.º 1/2018, de 2 de novembro) e o IAVE aceita que o que sai no próximo exame nacional deve resultar da «intersecção dos documentos curriculares» (que são os velhos programas e as novas «aprendizagens essenciais»), pelo que, segundo o conceito matemático de «intersecção de dois conjuntos», o que é novo nas «aprendizagens essenciais» fica… excluído, o que pode parecer esquisito, mas que se justifica relativamente aos conteúdos de 10º ano leccionados o ano passado, antes da aplicação generalizada das «aprendizagens essenciais». Contudo, a «informação-prova» do IAVE contempla «temas/unidades a avaliar» em exame que não fazem parte das «aprendizagens essenciais» definidas pelo ministério. Em que ficamos? Dito de outro modo: permanecem dúvidas sobre os exactos conteúdos a testar em exame, dúvidas que não existiriam se tivessem sido elaborados programas novos com indicação clara dos conteúdos (actualizados) a ensinar (se este verbo ainda tem aplicação…), dispensando a angustiante necessidade de proceder à exegese de diversos e díspares documentos burocráticos.
Como se não bastasse, sobrepõe-se ao «nevoeiro» reinante o objectivo de produzir sucesso (quase pleno e quase obrigatório). Ainda que estatístico. O que acabaremos por alcançar.
Mas sem motivos de congratulação. Porque, embora previsível, não quadra. Jocosamente, há quem lhe chame o circo da quadradura.
José Batista d’Ascenção
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