Se se estiver no oceano Antártico e se vir a água avermelhada, ao longo de poucos metros ou estendendo-se por vários quilómetros, fica-se a saber que se está perante dezenas de milhares de animais minúsculos que, provavelmente, atrairão dezenas de outros muito maiores. Trata-se de um pequeno crustáceo parecido com o camarão, cuja carapaça apresenta uma cor vermelho vivo. Como muitas espécies de água fria, cresce lentamente e tem uma vida surpreendentemente longa. Os seus ovos eclodem nas profundezas escuras do oceano Antártico e as larvas nadam durante vários dias até à superfície para se alimentarem de fitoplâncton (plâncton que realiza a fotossíntese). Demoram então três anos até atingirem o tamanho adulto de 5-6 cm de comprimento.
Quando a estação escura começa a instalar-se e o fitoplâncton entra em declínio, por falta de luz, o krill abranda o metabolismo e adapta a dieta, passando a consumir algas que vivem no gelo, detritos do leito marinho e até zooplâncton (plâncton de natureza animal). Mais notavelmente ainda, o krill diminui de tamanho no Inverno (decresce, afinal), operando uma regressão da fisiologia sexual, retrocedendo, de forma efectiva, à sua fase juvenil, com necessidades energéticas mais reduzidas. Esta redução de porte permite-lhe usar a proteína corporal para subsistir durante esses períodos. Com o regresso da Primavera, recupera as suas características sexuais, tornando-se plenamente maduro, a tempo da época de acasalamento.
Pinguins, peixes, focas, e lulas contam com o krill como componente substancial da dieta. No caso das baleias-de-barbas, filtradoras, como a baleia-de-bossa, a baleia-azul e a baleia-sardinheira, o krill compõe uma porção muito grande da sua alimentação. Pode haver 10 000 krill num metro cúbico de água e uma baleia-azul consegue engoli-lo todo de uma só vez. As baleias dependem tanto do krill que se concluiu que as taxas de gravidez das baleias-de-bossa mantêm uma correlação com a disponibilidade de krill na zona.
Os excrementos das baleias são ricos em ferro (proveniente do krill, de que se alimentam), nitrogénio e fósforo e, regra geral, as baleias defecam à superfície ou próximo dela. Os excrementos fertilizam a água e promovem o crescimento do fitoplâncton. O fitoplâncton alimenta o krill. Por consequência, pensa-se que a presença de mais baleias leva, na verdade, à presença de mais krill, não menos.
in: «Oceano, o último reduto selvagem», David Attenborough e Collin Butfield. Ed. Temas e Debates. 2025. 343-351 p.
José Batista d’Ascenção
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