Uma equipa de investigadores da Universidade do Porto, da Universidade de Coimbra e do Instituto Universitário de Lisboa fez um estudo sobre a praxe universitária, no sentido de a “conhecer em profundidade” e como “requisito fundamental para a definição de medidas que previnam excessos e abusos”.
Ali se diz, entre muitas outras coisas, que «o ethos da praxe é (…) marcado pela inculcação de valores antidemocráticos e de sacralização da autoridade», coisa que não é difícil concluir (e, atenção, este apontamento não pretende diminuir a importância do estudo feito), dado o modo como os pais estão a educar os filhos e a deriva da escola, em matéria de exigência do cumprimento de normas éticas, de acatamento da disciplina e de comportamento aceitável. Podíamos acrescentar que também os modelos socio-políticos deveriam sofrer alterações ou, no mínimo, haver consequências visíveis para os prevaricadores e corruptos, mas este problema ficava em grande parte resolvido, se a família, primeiro, e a escola, depois, estivessem à altura do cumprimento das suas obrigações. E não estão, e nada indica que venham a estar, num futuro próximo… Parece que temos muita dificuldade em aceitar, reclamar e exercer a autoridade na família e na escola: tanto quanto os meninos parecem desejá-la e sujeitar-se voluntaria, injustificada e erradamente a ela no primeiro ano dos cursos universitários. Isto tem tanto de paradoxal como de… real, o que devia, senão envergonhar-nos, pelo menos ensinar-nos…
Quanto às recomendações, elas incluem, e passo a referir (com comentários meus entre parêntesis):
- monitorização de proximidade por parte do provedor do estudante;
- não legitimação institucional das estruturas da praxe;
- difusão anual de um panfleto realçando o carácter não obrigatório da praxe [o que faz todo o sentido]; e que seja incluído no ensino secundário um tópico específico sobre o tema, aconselhando mesmo uma edição do parlamento dos jovens subordinada ao tema das praxes [Esta proposta facilmente redundaria no elogio do que se quer combater. Só quem não conhece o grau de descrédito a que o ensino secundário (e o básico, já agora) chegou, pode propôr tal coisa. No estado em que as coisas estão, eu diria que, para não alimentar a chaga, melhor é que o ensino secundário não seja metido ao barulho – bastando que nada faça que promova o cancro, como em tempos ocorreu, por exemplo na chamada “área de projecto”, em que “papas” da universidade vieram a escolas secundárias fazer sessões sobre as características entusiasmantes das praxes. O meu choque foi tal, na altura, que até guardei um exemplar dos cartazes (impressos na reprografia) a publicitar a coisa!];
- oferta de alternativas à praxe; como actividades lúdicas, pedagógicas e formativas de integração na vida académica;
- responsabilidade irrenunciável dos órgãos de gestão, podendo vir a ser responsabilizados por não proibirem ou não sancionarem práticas ilícitas, contrárias à dignidade humana.
É de louvar e agradecer o trabalho das universidades e, em particular, das equipas que propõem estas medidas. E, de caminho, elogiar também a clareza e a coragem do ministro Manuel Heitor que não tem vacilado no que respeita a esta matéria.
Já não era sem tempo: mais vale tarde que nunca.
José Batista d’Ascenção
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