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Meus caros alunos:
Por estes dias, os vossos pais preocupam-se com os que vocês ficam a fazer em casa ou na rua enquanto eles vão trabalhar. É possível que alguns até fiquem aliviados porque vocês dormem até (quase) ao meio dia (ou a passar disso), na suposição de que, enquanto dormis é menos provável que vos aconteçam coisas menos boas. Este modo de sentir é compreensível por todos quantos têm filhos na vossa idade, e vocês o compreenderão muito bem, mas só daqui por alguns anos… E se os pais estiverem empregados, esse receio porventura aumentado tem o reverso vantajoso de implicar uma fonte de sustento para a casa, situação que não é privilégio de todos, como alguns de vocês sabem e sentem.
Pela vossa parte, admito que haja também algum tédio neste tempo de fim de férias e pouco entusiasmo no que pod(er)ia ser a facilitação da vida dos pais nos dias em que ainda não há estudo: arrumar os quartos, dar um jeitinho na limpeza da casa, preparar as refeições, levantar a mesa, lavar a loiça, etc. Assim lhe aliviáveis as tarefas, para além de lhes manifestardes carinho, consideração e respeito. E o tempo até custava menos a passar. E tínheis depois muito mais sabor no encontro com os amigos, a quem poderíeis contar com orgulho a vossa participação nas tarefas domésticas. Vantagem não menor e que sentireis num tempo eventualmente mais próximo é quando viverdes fora da casa dos pais (na universidade, no trabalho, na constituição da vossa família mais restrita…) e sentirdes que não vos assusta organizar a vossa casa ou o vosso espaço, tratar da vossa comida, da vossa roupa, etc.; ou seja, na autonomia que precisais adquirir, sabendo fazer as coisas ou, caso a vossa situação financeira o permita, sabendo como as coisas se devem mandar fazer ou verificar ser foram devidamente feitas. Perdoai, se puderdes, este discurso comezinho, mas sabei que ele é útil e necessário e bom. Claro que a ocupação dos vossos tempos pode e deve ainda contemplar o lazer, coisa que pode sair muito barata, se optardes pela música ou pela leitura, por exemplo, para além do desporto, como é evidente. Muito compensador e formativo, mas com pouca prática entre os portugueses, é os jovens praticarem trabalho voluntário, ajudando quem precise. E há tantas pessoas que precisam…
Nós, os professores, estamos às voltas com a preparação do novo ano lectivo e vivemos, como vós, na expectativa e com alguma ansiedade. Uns quantos de nós foram parar longe de casa, em ambiente e com pessoas que não conhecem e sofrem muito com isso. Desde logo porque alguns têm filhos… Mas não vos maço com as preocupações dos que vão tentar ensinar-vos algumas coisas nos próximos meses. São os ossos do ofício. A vós cabe-vos encetar mais um ano escolar com toda a energia que puderdes e tentando cumprir a vossa parte. Não é necessariamente fácil a vossa tarefa, mas também não tem que ser, nem deve ser, um martírio. Pensai que há muito para aprender e que ficareis pessoas cada vez melhores e mais capazes quanto mais aprenderdes. A ignorância é uma prisão pobre, feia e triste. Saber é capacidade, é liberdade, é beleza, é a possibilidade (mais provável) de construir uma vida bonita e compensadora, por cada um e por todos.
Aceitai o desafio, com os vossos professores.
Felicidades. Até um dia destes.
José Batista d’Ascenção
(1) Além de antiquada, esta mensagem pode ser entendida por alguns como discurso moralista. Este risco de incompreensão reforçou em mim a vontade de escrever um texto assim, devido ao facto de não aceitar que se confundam os conceitos de “educação” e de “mistificação”, com prejuízo dos jovens do meu país, especialmente os mais pobres.
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