sexta-feira, 14 de setembro de 2018

A «peste grisalha» e a solidão dos professores

Imagem obtida aqui.
Envelhecido, o corpo docente das escolas básicas e secundárias do país vive, desde há anos, e de forma progressiva, tempos que não são propriamente exaltantes. Por vários motivos:
- os candidatos à docência gostariam que seniores e veteranos saíssem da profissão (o que, não sendo um sentimento nobre, é humanamente compreensível);
- provavelmente, os alunos, em geral, simpatizam mais com professores mais jovens;
- alguns pais pensam/sentem como a generalidade dos alunos, embora haja ainda um ou outro que associa os professores chamados da «velha guarda» (que já não existem nas escolas…) a mais rigor, disciplina e eficiência no ensino;
- os políticos com funções governativas, independentemente da «cor política», parece dedicarem-se a um jogo persistente de desgaste e de perturbação dos professores, moendo-os quanto podem,  e tentando empurrar os mais velhos para a reforma, com penalização dos quantitativos a receber, para dar lugar a outros que, sendo mais novos, posicionados em escalões inferiores, ficam mais baratos;
- os professores de mais idade, dos escalões mais elevados, sentem-se, em alguns casos, indesejados pelos alunos, pelos colegas mais novos, por muitos pais, pelos governantes e mesmo pela comunidade em geral. Noutros casos, sentem-se também sem forças e sem saúde e, eventualmente, em grande solidão;
- os professores mais novos, tantas vezes com cônjuge e com filhos pequenos, são colocados a muitos quilómetros da sua residência e fazem esforços sobre-humanos para conseguirem trabalhar, pagar as despesas e assistir os familiares. Muitos submergem igualmente na solidão;
- o governo trata os professores como «ratos», como se o sistema educativo fosse uma ratoeira, e faz equivaler a sua acção a gerir (no tempo e nas diferentes escolas, consoante as circunstâncias e as oportunidades) as porções de «queijo» que usa nos dispositivos de mando em que se considera ungido (os termos entre aspas foram usados com este sentido há uns anos por um secretário de estado da educação);
- os professores, os sindicatos que não os representam e os que os representam mal, e que são em número espantoso (mais de vinte!), alimentam, voluntária e involuntariamente, o jogo dos governos, de que desconfiam, tanto quanto desconfiam uns dos outros (os professores em relação aos sindicatos e os sindicatos entre si e relativamente aos professores), com prejuízo da imagem social de todos, perante os alunos, os pais e a sociedade em geral.
Num contexto assim, um deputado da nação, de legislatura anterior à actual (em 2013), referindo-se ao aumento das despesas sociais com os reformados, tratou-os por «peste grisalha». Já um ex-primeiro ministro, depois presidente da república, alertara para o peso imenso dos funcionários públicos, em matéria de finanças, afirmando que nem a reforma era solução (porque deixavam de fazer descontos, diminuindo as receitas do Estado), restando esperar que morressem. O primeiro está mais perto de ser ou já é grisalho e o segundo é um multi-reformado.
Por mim, não chamarei peste a nenhum deles, nem a qualquer deles desejo a morte.
Para onde vamos, meu país?
Que fazemos, professores? 

José Batista d’Ascenção

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