quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Libertar os professores de tarefas que não sejam ensinar

…”há que libertar os professores de, praticamente, todas as tarefas que não sejam as de ensinar.”
A frase é do Professor Galopim de Carvalho e está publicada em sítios como este e este.

Se quiséssemos que a Escola funcionasse e que os alunos aprendessem, aquela condição devia ser fundamental. Mas, na realidade, não é. Nem pouco mais ou menos. Nem se vê como possa vir a sê-lo.
Certo que as nossas condições sócio-psico-culturais são as que são e não são um bom ponto de partida. Quantos portugueses têm o hábito (leia-se “gosto”) de ler? Quantos poderiam ler correctamente, se momentaneamente o desejassem? Quantos podem fomentar a aprendizagem escolar dos filhos com a sua própria sabedoria, disponibilidade e riqueza cultural? Quantos meninos e jovens portugueses terão visitado um museu levados pelos seus pais? E quantos museus portugueses têm algum tipo de atenção a uma possível visita de crianças?...
Das condições materiais de tantas famílias, nem vale a pena falar…
O que podem as escolas e os professores fazer? Deviam poder muito. É sua obrigação fazerem muito. Mas é preciso dar-lhes algumas condições. Seguem-se alguns exemplos.
Os programas curriculares devem ser elaborados por quem saiba profundamente as matérias a leccionar. E, se possível, por quem tenha boa prática de ensino. Não deve ser o caso. Como exemplo, péssimo, aliás, pode-se referir o programa de biologia do 10º ano de escolaridade, que não tem qualquer lógica, nem sequência nem articulação. Mais parece ter sido feito para impedir que os alunos aprendam e que os professores consigam ensiná-los. E vigora há uma dúzia de anos. Porém, os professores nem reclamam muito (nada, a bem dizer), porquanto, muitos deles são de opinião que, sempre que os programas são mexidos, consegue-se sempre que fiquem (ainda) piores do que estavam.
A formação dos professores devia ser muito rigorosa, na sequência de exigente selecção de quem pode aceder à profissão e partindo de uma sólida preparação científica nos bancos das universidades. Depois é preciso actualização e aprofundamento ao longo de toda a vida profissional dos docentes. E essa formação só devia poder ser ministrada por quem reunisse indiscutível credibilidade científica e pedagógica, sendo que a segunda não pode existir sem a primeira. Ora, a chamada formação contínua dos professores está muito longe de os tornar melhores profissionais, porque em grande parte é um pró-forma, de que não poucos se vão afastando, agora que a progressão na carreira é uma miragem e acumular diplomas inúteis não desperta interesse. Não se pense que o que fica dito é exagero. No final do ano lectivo passado, alguns “centros de formação” mandaram que se fizesse um levantamento de necessidades junto dos professores, e houve os que, na área da biologia e da geologia, em meados de Junho, pediram formação em temas especificos como: Dinâmica das membranas biológicas e transportes transmembranares (aprofundamento e atualização); Evolução por simbiose: aparecimento da respiração e da fotossíntese na célula procariótica e na célula eucariótica; Aspectos novos da replicação do DNA, transcrição, processamento e síntese proteica; papel do RNA de transferência; chips de DNA; Engenharia genética; Práticas de micropropagação; Sismologia; Metamorfismo - recristalização, classificação de amostras de rochas; Cristalização de magmas; Tectónica de placas. 
Um mês depois chegava o plano de formação aprovado para o biénio 2016-2018 e, dos temas pedidos, consta(va)m dele… nenhuns.
Passou o Verão e em meados de Setembro começaram as aulas. Eis que chegou então, do (mesmo) centro de formação “o mapa síntese das temáticas/ações que constam dos Planos de Ação Estratégica dos Agrupamentos/Escolas associadas para o biénio 2016/2018”…, acerca dos quais, a primeira coisa que se pede é que “verifiquem, (…), se relativamente à vossa Escola/Agrupamento a síntese anexa está correta”;
Ora, como há professores que não desistem do que lhes parece necessário para poderem trabalhar melhor, logo alguém respondeu a quem reencaminhara aquela mensagem do seguinte modo:
“Que pena, os professores não poderem ter a formação que precisam efectivamente, nem ser dada nenhuma explicação sobre o facto... E pensar que os centros de formação deviam servir para isso...”
O que mereceu pronto esclarecimento, pela mesma via:
…“este não é o plano de formação do agrupamento mas o de ação estratégica que não é bem a mesma coisa mas simplesmente o que neste momento (de política de educação) tem prioridade.”
A que o recalcitrante (ainda) respondeu:
“Pois, de acção estratégica, chamam-lhe, e a dificuldade é perceber que acção estratégica será, se não vai ao encontro das reais necessidades (ia a escrever prioridades...) dos professores”…

E é desta forma que habitualmente (não) “resolvemos” os nossos problemas. Porque se insiste no “método”?

José Batista d’Ascenção

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