segunda-feira, 14 de maio de 2018

A recta final

Alguns dos meus «pupilos» estão fartos das aulas. Parte destes estão fartos das minhas aulas. E um ou outro estará farto de mim (sendo que não tenho razões pessoais de nenhum, aprecio e agradeço a simpatia com que me tratam e a todos estimo, sem excepção).
Eu próprio estou farto de recear que talvez o meu esforço (e desejo e vontade e medo e esperança) para não deixar nenhum para trás, mais que transmitir-lhes coragem, possa acentuar em alguns deles o receio de fracasso e, quem sabe, a tendência para mandarem tudo às malvas, procurando algum alívio imediato, por desistência, em vez persistirem na busca do melhor resultado possível e de alguma compensação final, ainda que seja a consciência tranquila por terem lutado com todas as forças ao seu alcance, o que, parecendo pouco, nunca o é, de facto.
O papel dos alunos no ensino secundário não está fácil: para os que pouco se interessam não é compensador e para os que se interessam realmente e trabalham (alguns muito) pode ser frustrante. Isto é particularmente verdadeiro na área da biologia e geologia, disciplinas que se tornaram um horror (vejam-se os resultados) depois da introdução dos «novos» programas no dealbar do milénio, muito abrangentes, genéricos e vagos e recomendando explicita e repetidamente ligeireza e facilitismo aos professores, por um lado, e, por outro lado, com exames puxados e desfocados desses programas, algo charadísticos e com as perguntas de maior cotação, que exigem respostas pensadas e articuladamente redigidas, formuladas de modo por vezes pouco claro, face aos objectivos (tecnicamente diz-se tópicos) pretendidos. E tudo isto afectado pela competição pela entrada no ensino superior, especialmente em alguns cursos, o que faz com que no ensino secundário se ensine menos para se aprender e saber e mais para ultrapassar obstáculos bem definidos (a prestação em exame e a entrada no curso superior desejado). Esclareço, antes de mais, que sou a favor de exames, mas exames rigorosamente elaborados, em conformidade com programas bem feitos e claros e respeitadores do trabalho de alunos e professores. Que é o que não temos tido no âmbito da (disciplina de) biologia e geologia e os resultados comprovam.
O papel dos alunos no ensino secundário não está fácil, de facto, e outra das razões é que o ensino básico está, na prática, aligeirado e facilitista (pelo menos em termos de progressão) para as crianças (e não tinha que ser nem deve ser difícil, atenção), de que resultam deficiências de conhecimentos e não só... (ou de competências, como quiserem) que dificultam muito a aprendizagem no secundário. Abordar este problema é uma blasfémia que ninguém está disposto a ouvir, mas que trama seriamente uma fracção muito grande de alunos, especialmente os filhos dos mais pobres, cujas famílias não podem pagar explicações por fora ou escolas de línguas e muito menos certas escolas privadas em que não há receio de ensinar, mas de onde se excluem, para além dos meninos de famílias sem posses, aqueles que têm dificuldades de aprendizagem ou problemas de comportamento. Este é um problema social e político e pedagógico que não está a merecer a análise devida, quanto mais a resolução, que envolveria sempre muitas dúvidas e percalços… Mas como, se a própria condição dos mais frágeis os inibe de reclamar o que deviam ser direitos seus?
Por isso, temos aqueles alunos cuja condição familiar, sócio-afectiva e psicológica, e económica é tão precária que nem eles reúnem as melhores condições para aprender nem as escolas nem os professores conseguem facilmente proporcionar-lhes essas condições.
Assim mesmo, não é tempo de desistir, nem de admiti-lo sequer, nem de esquecer que todos os alunos são alunos. A vindima é até ao lavar dos cestos, diz-se, e cada um tem que fazer a sua, desejavelmente com o apoio e ajuda e carinho dos que estão à volta.
Até ao fim.
Vamos lá.

José Batista d’Ascenção

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