quarta-feira, 30 de novembro de 2022

A enorme responsabilidade de fazer manuais escolares

Frequentemente, ao ler matérias que lecciono (no ensino secundário) estremeço (e envergonho-me) com os erros que cometo. Vai longe e está desactualizado (há muito) o que estudei na universidade. Acontece que ser professor de biologia e geologia abarca tal pluralidade de conteúdos, e alguns com tão poucas relações directas, que dificilmente um professor, por mais que leia e estude autonomamente, consegue estar em dia com os conhecimentos mais recentes nas diversas áreas.

Por isso, sempre fui crítico da multiplicação, repetição e predomínio de acções de formação sobre o modo de ensinar em detrimento das de actualização de conhecimentos em domínios em que devia caber às universidades disponibilizá-los, e a que os docentes de cada disciplina deviam ter acesso gratuito ou integralmente subsidiado, em tempo oportuno e compatível.

In: Rui Dias, "Portugal Antes da História", 1º volume "Da Dinâmica Global aos Processos Geológicos"

O mesmo desconforto sinto quando analiso e trabalho com certos manuais escolares adoptados (até com a minha concordância ou mesmo preferência!). E sou crítico tanto em relação às deficiências de conteúdo como no que toca às supostas pedagogias que pressupõem.

Por vezes, vem-me à memória o que ouvia à minha professora de matemática, Amélia Chagas, no que foi o Liceu Nacional de Castelo Branco, em finais da década de 70 do século passado, no que então se chamava ensino complementar (hoje ensino secundário): os manuais do ensino secundário deviam ser feitos pelos professores do ensino superior, podendo os (dos anos finais) do ensino básico ser elaborados por professores do ensino secundário. O argumento radicava na convicção de que os professores de cada nível sabem bem quais são as bases que julgam (mais) necessárias ao início do ciclo de estudos em que trabalham. A esta ideia não faltam obstáculos de concretização, mas não pode apontar-se-lhe falta de lógica.

Outra possibilidade seria o ministério da educação propor a professores de diferentes departamentos universitários ou outros, de méritos reconhecidos, a elaboração de materiais pedagógicos, incluindo livros, textos de apoio e/ou exercícios, relativos às rubricas dos programas das disciplinas de ciências, como em tempos (já em democracia) houve. No mínimo conseguia-se uma base de qualidade isenta de erros grosseiros, facilitadora da aprendizagem e da acção dos professores. Esse trabalho já é generosamente feito, de modo inteiramente grátis, por pessoas como os Professores Galopim de Carvalho e Jorge Paiva. Outros, como o Professor Rui Dias publicam livros essencialmente para professores. Nada se perdia em tornar esse serviço mais definido e sistemático, recompensando devidamenre os seus autores.

José Batista d’Ascenção

domingo, 13 de novembro de 2022

A nossa língua e o ensino

Na aula (sobre expansão dos fundos oceânicos) calculávamos a velocidade de afastamento de dois pontos situados em placas litosféricas diferentes (por exemplo nas ilhas das Flores e da Graciosa, nos Açores), em movimento (geológico) divergente, e de cada um dos pontos em relação à origem da deslocação, a meio da distância entre os dois (na zona de rifte).

Para esquematização dividimos o quadro ao alto, a meio, e proponho que titulássemos:

- à esquerda: se considerarmos a velocidade de afastamento de qualquer dos pontos em relação ao rifte;

- e à direita: se considerarmos a velocidade de afastamento das ilhas uma em relação à outra.

A aluna, no quadro, escreve: «se considerar-mos…»

Nenhum dos alunos dá por nada. A minha cara deve ter sido de poucos amigos, pelo que a menina, hesitante, pergunta:

- Setôr, «considerarmos» existe?, não deve ser «consideramos»?

Repliquei: se eu considerar, se tu considerares, se ele considerar, se nós considerarmos… etc.

E insisto: - Isto diz-lhes alguma coisa?

Mutismo.

Mando então que seja eliminado o hífen.

E logo um rapaz muito vivo, lá ao fundo:

- Mas então, não tem que ter tracinho?

Sai-me, num grito: - Burro!

Nunca na minha vida tinha dito tal coisa a um aluno. Além do mais, a minha expressão era tão dolorosa e revoltada, quando falha de objectividade. E logo o reconheci.

Para minha surpresa, o rapaz sorri abertamente e faz questão de dizer:

- Não há problema nenhum.

Resta acrescentar que nem aquele aluno nem a generalidade dos alunos daquela turma (de 10º ano), incluindo a menina que estava no quadro, têm falta de inteligência. Nem de simpatia nem de boa educação, já agora.

A desgraça vem do estado a que a «escola» chegou, qual seja a de que muitos alunos não percebem o que os professores dizem, nem entendem o (pouco) que lêem.

Curiosamente, ainda há poucas horas ouvi o novel líder do PCP afirmar, no início do seu primeiro discurso, que, «se dúvidas houvessem»… (sic), e referir, pouco depois, que as crianças têm direito a ser felizes e a aprender…

Lá direito têm. Ou deviam ter.

José Batista d’Ascenção

domingo, 30 de outubro de 2022

A greve dos professores que nada resolve(rá), mas que eles não podem deixar de fazer

Em momentos de maior desânimo e perplexidade chego a admitir que a escola pública existe para não funcionar.

O emaranhado de leis, normas e documentação é de tal ordem e de tão má qualidade que, quando se consegue ler, não se destrinça nele coerência nem rumo nem aplicabilidade. É uma espécie de teia de arrazoados pesporrentes, abstrusos e impraticáveis.

As instâncias hierárquicas fazem política (de fraca categoria) e, basicamente, pretendem estatísticas que lhes tragam benefício formal que justifique cargos e protagonismo. As direcções escolares representam o poder e colam-se à função. Os conselhos gerais não servem para nada e é um bem quando presidente e director(a) não colidem abertamente. Os conselhos pedagógicos e os conselhos de directores de turma são comissões de burocracia. Os conselhos de turma e os grupos disciplinares, legal e impropriamente ditos de recrutamento (agrupados em departamentos artificiais, cuja pertinência ou utilidade nunca se descortinou), somam mais burocracia à burocracia estipulada, com estulta diligência.

O inadequadamente chamado sistema de avaliação de professores é um horror sem classificação ética possível e cumpre uma função (pouco) críptica, que é a de evitar a despesa decorrente das progressões na carreira.

As aulas e a aprendizagem do saber que é património da humanidade, e que começa na simples necessidade de saber ler e escrever, são chocantemente desvalorizadas. A serenidade, a disciplina e a boa educação também.

Os professores no activo são destratados (ou agredidos) e estão fartos de não lhes permitirem realizar a sua função básica elementar. Estão velhos e envelhecidos e, não poucos, com a saúde arruinada. Alguns exibem agora umas aplicações no telemóvel com um contador decrescente (até ao segundo) do tempo que lhes falta para se aposentarem.

Os jovens não querem ser professores. E dos que, apesar de tudo, querem, parte deles talvez fosse melhor que seguissem outras profissões.

De um tal rol, parece que não há coisas boas no ensino. Mas há: continua a ser maravilhoso estar na sala de aulas com alunos minimamente motivados, tendo o cuidado de fechar a porta para atenuar o barulho dos corredores.

E há as crianças e os jovens em si: os problemas são múltiplos e diversos, mas não são eles a fonte.

José Batista d’Ascenção

domingo, 25 de setembro de 2022

Os alunos que este ano me couberam

Os meus alunos deste ano, todos novos para mim, causaram-me boa impressão. Corrigidas as fichas de avaliação diagnóstica, foi sem surpresa que constatei o carácter pouco efectivo do que realmente convinha estar aprendido ou a inconsistência do que muitos, apesar de tudo, retiveram. Quem manda na “educação” ignora (ou despreza) estes factos, mas a realidade é a que é, independente das esponjas que lhe passem por cima ou do “verniz” que lhe apliquem. Não digo isto por acaso: o ano passado voltei a leccionar a alunos do ensino básico e foi um choque terrível: onde todos (os elementos do conselho de turma) viram excelência, eu confirmei os meus receios, os quais, naturalmente não pressupõem qualquer falta de capacidade dos meninos, antes derivam da ficção que ilude o facto de quase não se ensinar nada a muitos alunos, independentemente de se “conseguir taxas de sucesso” que enganam sobretudo os filhos dos mais pobres. Por essa razão e por nunca ter esquecido as minhas (próprias) origens não alinho, nem de longe, na ideia de que a “educação” em Portugal é um “rolls-royce”.

Voltando aos meus alunos deste ano, para já, vi humildade e disponibilidade, o que, se não for meio caminho andado, é um bom início para o caminho a percorrer.

Não quero génios, que nunca encontrei nos muitos anos que levo de professor, e tive, obviamente, excelentes alunos, mas fico satisfeito com meninas e meninos que não trazem o rei na barriga e estão dispostos para trabalhar.

A felicidade deles será a minha. E todos os meus esforços serão poucos para os ajudar, como sinceramente desejo.

José Batista d’Ascenção

sexta-feira, 9 de setembro de 2022

Mais um início de aulas

 

O recomeço de cada ano lectivo é um factor que perturba a placidez do mês do calendário que mais aprecio: Setembro. Até ao primeiro contacto com os alunos, na sala de aulas, a ansiedade vai crescendo e só por essa altura se liberta. A partir daí, a tensão vai decrescendo até se situar num nível-base gerível que, com oscilações mais ou menos acentuadas, dura todo o ano. Tem sido sempre assim.

Quem e como serão os meus alunos, como é que eu vou estar, com que energias, com que disponibilidade física, e com que ânimo e capacidade de estímulo vou apresentar-me perante eles? São perguntas que me martelam o espírito por estes dias.

Penso, por outro lado, na angústia dos jovens e na expectativa que muitos terão relativamente ao reinício das aulas. Admito que as emoções próprias da idade, as relações entre eles e a influência e a dependência das condições familiares possam sobrepor-se, em muitos deles, às preocupações com o que deveriam aprender nas diversas disciplinas. É normal que assim seja. Mas sei que alguns, de si próprios e face à atenção e cuidado dos pais, se inquietam com o que vão ter que estudar e com as “notas” que precisam tirar. E, em número mais restrito, outros vivem “stressados” com a “vigilância” e exigência familiar relativamente àquilo que será o seu “rendimento”.

Não me pronuncio sobre as confusões da escola pública nos tempos que correm. Por agora é o combate de mim comigo sobre a melhor forma de ir ao encontro dos meus alunos. E o desejo renovado de que a realidade não arruíne as intenções. Estou a trabalhar para isso.

José Batista d’Ascenção

quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Cultura de inovação pedagógica, dizem

Depois de um ano lectivo à bulha com grelhas de avaliação, decorrentes do que chamaram “projeto MAIA”, o qual, a meu ver, não trouxe proveito à (a)normalidade do dia-a-dia escolar, nem à sua desejável tradução na aprendizagem efectiva dos alunos, obriguei-me a ler, nestas férias, o fascículo “Avaliar e aprender, numa cultura de inovação pedagógica” de Domingos Fernandes, o primeiro autor do dito projecto.

São pouco mais de 70 páginas de “literatura” apologética de práticas pedagógicas que, em minha opinião, fomentam o percurso de descrédito da escola pública e arruínam a saúde e o prestígio dos professores, em estado já muito precário.

As modalidades de avaliação são cada vez mais e a sua fragmentação burocrática continuará, pouco importando se o que se recomenda tem execução possível ou se, tendo-a, isso melhora verdadeiramente a aprendizagem. O mesmo para o conceito de “feedback”, a «distribuir» (p. 49, 50, 51, 52, 54, 57, 58, 59, 68) aos alunos (eu pensava que era “dar”, “prestar” ou “fornecer”). Insiste-se em que os alunos têm que ter participação activa nos processos de avaliação dos próprios e, como se isso não bastasse, nos dos seus pares, para além da «participação na discussão de critérios, de descritores e de rubricas de avaliação (p. 15)». Não se sabe se os proponentes destes processos conhecem a aversão com que muitos alunos os recebem ou a repulsa legítima que causam em não poucos encarregados de educação, particularmente aqueles que são mais exigentes na preparação dos seus educandos. Segundo o autor, a “inovação pedagógica” é «entendida como um processo contínuo de (re)invenção das práticas e formas de estar com os alunos e com as matérias, materiais e objetos de aprendizagem que dão forma e sentido à profissão”… (p.72). Parece-me uma definição de conveniência para sustentar a asserção redundante de que «só inovando se podem melhorar as estratégias de ensino e de avaliação, a partir de leituras do currículo e da pedagogia que não podem deixar de ser inovadoras» (p.7). Neste particular vem-me à mente o chamado “Instituto de Inovação Educacional” (Dec.-Lei n.º 3/87) e os contributos para a melhoria da escola pública que devia ter produzido ao longo da sua existência: quem, no interior das escolas, retém algum com interesse?

Preconceituosa e insustentável me parece a afirmação de que «são as conceções e as práticas pedagógicas que herdámos do século XIX que continuam a prevalecer» (p. 5, 8, 13). No século XIX em Portugal, mesmo no seu término, que percentagem de portugueses sabiam ler? Quantas escolas havia? Quem as frequentava? Aqueles professores que viveram a escola por dentro nos últimos 40 anos sabem que, neste curto intervalo de tempo, há diferenças abissais, em qualquer aspecto, entre o que a escola foi e o que é. Assombra a acusação de uma suposta fixação em «ideias vindas do século XIX», tempo em que havia um abismo entre certas (e boas, mas não muitas) intenções reformadoras e a realidade educativa concreta do país, a que correspondia um analfabetismo tenebroso.

Decepcionante é a definição arbitrária de vários conceitos: quem sabe precisar, por exemplo, o que é um «domínio do currículo», quando o currículo o não define?

Chocante é a proposta de a «classificação pedagógica» numa disciplina se desdobrar em «várias notas», em oposição à «classificação clássica», em que há «uma única nota por disciplina» (p. 61, 62). Alguns professores aplicaram isto nos testes (apondo três números em cada um, por exemplo), o que espantou alunos e pais. Com que vantagens para discentes, encarregados de educação e docentes?

A irrealidade destas e doutras ideias manifesta-se no artificialismo vazio de alguns esquemas (veja-se a fig. 2 da p. 7), sobre os quais, assim como sobre a qualidade da escrita, é preferível não alongar os comentários… 

José Batista d’Ascenção

quarta-feira, 3 de agosto de 2022

O IAVE tem sempre razão

Exame de biologia e geologia, 2ª fase, questão I.20. Nela se pede justificação para a vantagem de um antibiótico relativamente a outro no tratamento do «embranquecimento» de corais. A resposta pretendida deve ater-se aos resultados de uma experiência ilustrada numa figura com imagens esquemáticas e num gráfico. Acontece que esses resultados não permitem qualquer conclusão que não seja hipotética e especulativa. E é em termos de mera possibilidade que os critérios estipulam o elemento conclusivo da resposta - aquele elemento, que, a meu ver, poderia ser outro, como alguns alunos apontam, só que não é aceite.

Custa-me que se arquitectem perguntas assim. A leccionação dificilmente capacita alunos para o artificialismo exigido em certas respostas. E não é o trabalho, nem a necessidade de alterar o período de férias já definido, que é o mais difícil para um professor que também foi classificador na 1ª fase. O que penaliza mesmo os que, como eu, defendem os exames nacionais - o panorama avaliativo nas disciplinas em que eles não existem é triste e grave - é que as provas sejam concebidas deste modo.

A um aluno que, perante tal pergunta, respondesse liminarmente que não há elementos que permitam inferir sobre qualquer vantagem ou desvantagem face aos resultados, apetecia-me atribuir-lhe a classificação máxima. Mas não posso. O IAVE tem sempre razão. Mesmo quando não tem.

José Batista d’Ascenção

domingo, 17 de julho de 2022

MONUMENTO NATURAL DAS PEGADAS DE DINOSSÁURIOS DE TORRES NOVAS-OURÉM

O projecto de um Homem Bom que não descansa: A. M. Galopim de Carvalho (texto do próprio, que muito se agradece):

Instalado na antiga Pedreira do Galinha, foi assim classificado, em 1996, pelo Decreto Regulamentar 12/96 de 22 de outubro.

O meu propósito relativamente a este Geomonumento é, talvez, um sonho ambicioso, mas todos sabemos que “sempre que um homem sonha, o mundo pula e avança”. Ultrapassa o muito e o bom que já ali se fez. Trata-se de uma iniciativa pessoal que só me compromete a mim, não só na qualidade de cidadão, que sempre fui e sou, mas também na de quem, desde a primeira hora, ali deixou muito trabalho. Já o afirmei, por palavras faladas e escritas, que não pretendo ultrapassar ninguém. 

Este meu propósito, muito claro e frontal, é: 

(1) divulgar amplamente a real importância científica, pedagógica, e cultural deste património natural; 

(2) lembrar que estas potencialidades constituem um grande atractor turístico, potenciado pela proximidade (10km) do Santuário de Fátima;

(3) convencer as entidades que o tutelam a encontrarem meios para fazer nascer um projecto a ser “pensado em grande”, com projecção internacional, compatível com as características que o distinguem a nível mundial;

(4) convencer as mesmas entidades a encontrarem o financiamento necessário à sua execução.

Estou a completar os 91 anos de idade e sei, portanto, que não o verei concluído, mas isso não me impede de trabalhar, empenhada e intensamente, para o pôr em marcha.

Afixado por: José Batista d'Ascenção

quarta-feira, 6 de julho de 2022

O elogio que a Escola Secundária Alberto Sampaio (Braga) merece

As magnificentes árvores do recinto da Escola Secundária Alberto Sampaio (ESAS), os espaços do seu recreio e os seus jardins interiores, tudo tão harmónico e bem cuidado, causam em mim um sentimento de apreço, acentuado pela dedicação e trabalho que pressupõem.

Tenho pena de que, na minha escola, depois da intervenção no parque edificado, há cerca de dez anos, em que o estado gastava como se fosse rico, não tenha sobrado espaço para se fazer algo parecido. Aos meus colegas (de grupo disciplinar) da Alberto Sampaio digo que tenho inveja deles. E eles sorriem.

Bem sei que nem todas as pessoas, mesmo professores, gostam de árvores grandes no interior das cidades, próximas das habitações. Ele é o pólen que pode causar alergias (problema que eu atenuo com alguns anti-histamínicos…), ele são as folhas que caem abundantemente no Outono, ele é o perigo de algum (grande) ramo cair e atingir pessoas ou carros ou edifícios, etc. Sendo verdade, o que requer os devidos cuidados, não é mais importante que o oxigénio que produzem, a sombra nos dias tórridos, o consumo de CO2, a libertação de vapor de água que ameniza a secura do pino do Verão, o facto de serem locais de poiso e de nidificação para certas aves e, coisa importante, o exemplo para as crianças e jovens que devemos formar. E há ainda a beleza do verde frondoso. Sim, a beleza do verde que vai faltando (com que o “verde-eucalipto” não se compara). 

Por isso, a comunidade de Braga e os seus órgãos de poder deviam estar gratos à ESAS, apoiá-la no cuidado e na manutenção do seu património vegetal e registar o seu exemplo.

Eu, que, praticamente, só lá vou levantar e entregar provas de exame, e que não tenho lá ninguém familiar, próximo ou remoto, como docente, funcionário ou aluno, anoto desta forma o meu humilde elogio.

E o meu agradecimento. 

José Batista d’Ascenção

quinta-feira, 30 de junho de 2022

(Des)caminhos da escola pública

 

Mercê da idade e das consequentes limitações de horário, voltei, ao fim de décadas, a lecionar no ensino básico.

As condições são agora outras. Em consonância com os desejos manifestos de alguns protagonistas do ministério da educação, quase não há silêncio nas aulas. Falta serenidade e audição atenta de quem devidamente intervém, seja professor ou aluno. E há muito quem aceite isto como se fosse desejável e formativo.

Na realidade, muitos meninos, mesmo (ou principalmente) aqueles a quem não falta materialmente nada, parece não distinguirem o espaço da aula dos corredores ou do recreio. E, não raro, dois ou três são capazes de se (com)portar tão impropriamente que perturbam dramaticamente a aprendizagem deles e dos restantes. Claro que é preciso interrogarmo-nos sobre se crianças de 12-13 anos devem cumprir, em cada dia, horas e horas encafuadas em salas repletas, a apanhar com conteúdos teóricos de 13 ou 14 disciplinas, mas isto mexe com outros interesses.

Daqui surge o problema da avaliação. É preciso apresentar sucesso. Não havendo, recai sobre o professor uma burocracia justificativa monstra, arrasadora das suas energias, sobretudo na situação comum em que a idade pesa. Para escapar ao «suplício» atribuem-se «notas» em que nem todos acreditam. Quem se desse ao trabalho de ler as actas das reuniões de avaliação, cada vez mais extensas, aperceber-se-ia de um nevoeiro discursivo intragável, tristemente revelador de realidades que se pretende esbater ou justificar. Será por causa disso que as direcções passaram a apostar na semestralidade, redutora do número de avaliações?

Como a escola pública é, e deve ser, para todos, ganharia eficiência e credibilidade, se:

- assumisse como requisitos fundamentais a boa educação e a disciplina nas aulas;

- exigisse dos professores e dos conselhos de turma rigor e a objectividade possível na ponderação e atribuição das classificações dos alunos;

- conferisse aos encarregados de educação a responsabilidade da decisão sobre a passagem ou retenção dos seus educandos, independentemente das “notas” conseguidas.

De contrário, a escola pública continuará a afundar-se em descrédito, impreparando crianças, destruindo professores e valorizando o (negócio do) ensino privado, o qual, orgulhando-se da sua qualidade pedagógica, até se pode dar ao luxo de escolher e de rejeitar alunos.

José Batista d’Ascenção

quarta-feira, 25 de maio de 2022

Nem o ministério da educação confia nos resultados de sucesso que exige aos professores

Decorrem no ensino básico as chamadas provas de aferição. Estas provas não se reflectem nas avaliações formais dos alunos, razão por que, no entendimento deles, “não servem para nada”. Em consequência, nem se preparam para a sua realização nem se esforçam durante a sua execução. Tanto se lhes dá! Pelo que, a credibilidade dos resultados dificilmente corresponde ao desejável.

Do ponto de vista do ministério, talvez interesse saber, particularmente após os tempos de pandemia (que persiste…) as áreas de saber mais e menos conseguidas, em várias disciplinas.

Porém, é legítimo que nos interroguemos sobre o porquê de não recolher esses dados a partir do trabalho dos professores, que todos os dias de cada ano lectivo lidam com os alunos e, no 2º e 3º ciclos, propõem as classificações que são ratificadas pelos conselhos de turma (reuniões de avaliação), nos finais de cada período e de cada ano lectivo. Com boa organização, e dispensando tanta burocracia inútil, devia conseguir-se. Além disso, manifestava-se confiança nos docentes, envolvendo-os na obtenção de informação útil.

O que sinto, enquanto docente, é que o ministério da educação não confia na capacidade e no rigor da avaliação dos professores. Reciprocamente, os professores percebem que o estudo feito não prima pela exactidão e (também) não lhe dão importância.

Que vantagens há em trabalhar assim?

José Batista d’Ascenção

domingo, 20 de fevereiro de 2022

Promessas e silêncio, em sinal de luto

O que a foto documenta talvez não seja o principal problema das escolas.
Ou, se o é, em grande medida, não devia ser. Imagem colhida aqui.

Durante a campanha para as últimas eleições legislativas prometi a mim mesmo que votaria num partido que dissesse (e propusesse) alguma coisa decente sobre o estado (enlouquecido e envilecido) da educação no país. No meu critério, nenhum o fez. Na antevéspera do dia de eleições, perante o sentimento de que se sobrepunha um dever mais alto, e para evitar males maiores, decidi quebrar a promessa.

Por me parecer inútil, tenho evitado pronunciar-me sobre o caminho por que segue a escola pública e a evolução do ambiente que nela se vive. E sobre a responsabilidade que pesa sobre os ombros dos professores, a qual não deixará de ser assacada preferencialmente àqueles que dão aulas (e não tanto aos políticos nem aos que dirigem e administram e alimentam o sistema).

Não vencido nem convencido, vou esforçar-me por ficar em silêncio. Por consequência, este espaço ficará à míngua de conteúdo e pode ser que (o) encerre, para não insistir em realidades que não sei nem quero nem posso doirar.

Pela dor e por pudor. 

Não termino esta nota sem registar um sentimento de homenagem aos que, em cada sala de aula, não desistem de ser professores nem aceitam banir o verbo ensinar.

No futuro (que é já amanhã) aproveitar-se-á o que for conseguido, se for possível. Temo que o resto predomine e tenha consequências que não sejam fáceis de suportar.

Por mais ou menos tempo que viva, creio que não ficarei surpreendido e tudo farei para não me queixar.

Disse.


José Batista d’Ascenção

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

A propósito da escola de hoje e da intimidação que nela (tantas vezes todos os dias) se vive

Anteontem, Domingo, lia um pequeno escrito de Ademar Costa, no jornal «Público», que versava (em português claro e límpido) sobre essa coisa do bullying nas escolas. O simplismo do texto, seguramente devido ao espaço exíguo a que se limitava, causou-me desconforto. E, de uma penada, reagi, também eu sujeito ao mesmo condicionalismo da quantidade de palavras permitidas, que o jornal hoje publica. Ei-las:


Intimidação nas escolas

Larvar ou explícita, a intimidação vexatória (bullying) existiu nas escolas que frequentei, como aluno, antes, em tempo de ditadura e de democracia, e como professor, até hoje.

E não se deve apenas nem principalmente à falta de auxiliares. Nem tem como vítimas somente os alunos. Há problemas muito mais complexos: a indisciplina mal (ou nem sequer) assumida na escola (que se quer) democrática; a desresponsabilização dos pais (que já frequentaram o mesmo tipo de escola); a desvalorização legal, institucional e social dos professores, que deviam ser mais do que (fracos) agentes de entretenimento de meninos, que fazem (mais ou menos) o que querem - veja-se a importância “pedagógica” com que se apela à e se propõe a chamada “gamificação” (até com formação creditada); o facilitismo e o demissionismo que se instalou, travestidos de sucesso; o não registo ou a justificação de muitas faltas para camuflar situações de baixa frequência ou abandono; etc.

Por outro lado, as más influências da “internet” não justificam tudo, já os fracassos da educação explicam muito. 

Sobra(-me) ainda a certeza de que muitos “doutores” de hoje são agressores de ontem.

Para que conste.


José Batista da Ascenção.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

Sobre incumprimento da redução da componente lectiva dos docentes de mais idade – o que me disse a Provedoria de Justiça

Que não tenho razão, na queixa que dirigi àquela entidade, consta no ofício que recebi. Basicamente, quando um professor é chamado a substituir outro, num tempo lectivo, com a totalidade dos alunos da turma do professor faltoso, esse tempo, que é lectivo para o professor ausente, não é lectivo para o professor que o substitui. As razões adiantadas para o não ser derivam – na interpretação dada - de tal não obrigar o professor substituto «a assumir responsabilidades de planeamento, preparação de aulas, avaliação e afins».

Realmente, a lei estipula que a componente não lectiva pode compreender «a substituição de outros docentes […] na situação de ausência de curta duração e o apoio individual a alunos com dificuldades de aprendizagem». O que eu supunha é que as actividades de substituição nunca poderiam deixar de se efectuar em condições pedagógicas dignas e compensadoras para alunos e professores. Mas não será bem assim. E a lei, usando ou permitindo o uso de conceitos artificiais de conveniência, fomenta a realidade que se vive nas escolas.

Mas que importa a realidade?

Já as instituições parecem não alcançar o que significa o professor substituto não poder «assumir responsabilidades de planeamento [mesmo que restritas ao tempo lectivo em que está perante uma turma de alunos que não têm a sua disciplina, piorando se um funcionário lhe indica um espaço que não se adequa à prática pedagógica que poderia desenvolver, ou que chega a ser indigno dela…], nem de avaliação do que se faz ou não faz com aqueles alunos nos tempos de substituição.

No fim de contas, a sua função prática é guardar alunos em qualquer espaço, de qualquer modo, estejam eles como estiverem, e não se queixar de nada, mesmo que haja motivo.

Não espanta, por isso, que a escola pública esteja como está.

José Batista d’Ascenção