Na manhã do dia 20 de Junho, eu e a minha serena e diligente colega Sandrine estivemos a vigiar o exame de geografia A do ensino secundário.
Na sala, apenas três examinandos. No início, em voz clara, doce e pausada, a Sandrine leu as instruções necessárias e convenientes.
Poucos minutos decorridos, um dos alunos, um latagão de barbicha, punha o braço no ar. E, acto contínuo, pedia aos professores um lenço de mão. A Sandrine procurou a sua (dela) bolsa, na secretária, olhando-me com ar interrogativo. Eu, apenas mexendo os lábios, disse(-lhe) que, por mim, não dava. E ela optou por não dar.
[Este desplante, que se tornou vulgar nas aulas, já vinha de antes, mas acentuou-se durante a pandemia. Sempre o combati: fazia sentir aos alunos que os toalhetes sobre a secretária se destinavam à desinfecção das mesas e deviam ser consumidos com parcimónia, evitando o desperdício injustificado e excessivo, e apelando a que cada um, salvo casos excepcionais, cuidasse da higiene de mãos e face a expensas próprias e do modo mais silencioso possível, reduzindo manipulações e trocas de material mais ou menos conspurcado (com vírus, bactérias, protozoários, fungos). Com sucesso, diga-se.]
Aquele mesmo rapaz, minutos depois, põe o exame de lado e deita-se sobre o tampo da mesa. Ninguém o incomodou.
Minutos mais tarde, outro dos examinandos chama a Sandrine para lhe apontar uma questão que, dizia ele, “era estúpida”. A Sandrine respondeu-lhe com um encolher de ombros que pretendia esclarecedor.
“Acorda” o examinando que se "deitara", volvidos mais alguns minutos, e pergunta à Sandrine se pode sair. Espantada, ela diz-lhe que não (repetindo o que havia dito antes de a prova começar…). E ele pergunta-lhe porquê. E a Sandrine explica-lhe, em tom baixo e muito resumidamente, que não pode. O rapaz volta a deitar-se sobre a mesa.
Pouco sossegado, o outro aluno, chama-me agora a mim, que me dirijo para a sua mesa, e lá está ele com o dedo apontado para a prova: «esta pergunta é estúpida». Dou meia volta, vou buscar a folha das «normas», coloco-me diante dele e aponto para o parágrafo a negro carregado, onde se diz que os vigilantes não podem fornecer quaisquer indicações aos alunos em prova. Ele olha para o meu indicador, depois para mim, e parece acatar.
Puro engano, poucos minutos depois, à passagem da Sandrine, junto de si, dispara outra vez: «esta pergunta é estúpida». Ela não lhe responde.
A 15 minutos do termo do tempo regulamentar, o “dorminhoco” põe o dedo no ar porque precisa de ir ao wc. Chama-se um elemento do secretariado para o acompanhar.
O terceiro aluno faz o seu exame, aplicado e em silêncio.
Antes do toque de saída, relembra-se que há 30 minutos de tolerância, que tem que ser usada até ao fim pelos que optem por beneficiar dela.
O aluno silenciosamente aplicado e o que não fez nada entregam as suas folhas de prova e saem. O segundo atira o enunciado para o balde do lixo.
O examinando sonoramente dubitativo opta por usar o tempo de tolerância.
Passados 10 minutos, este aluno diz que terminou e pede para sair. É-lhe dito que tem que esperar até ao fim. Esgotada aquela meia hora, o aluno entrega a sua prova, levanta-se, atira o enunciado para o lixo e sai.
Foi assim, aquela manhã de vigilância.
José Batista d’Ascenção