domingo, 12 de dezembro de 2021

E se os professores insistissem em que é fundamental ensinar os alunos?

 

Imagem adaptada, colhida aqui.
Este 1º período letivo optei por não me pronunciar sobre o que (vejo que) vai pelas escolas. Foi de propósito. Porque vou ficando velho, em consequência das reduções da componente lectiva, de acordo com o estipulado no «estatuto da carreira docente» (lei deturpadamente aplicada), voltei a ter alunos do ensino básico (7º ano de escolaridade), que não tinha desde o milénio passado…

E estão diferentes, os meninos. Como diferente está a escola: não propriamente melhor; e diferentes estão os professores: envelhecidos e, em larga medida, com a saúde e a capacidade profissional mais ou menos arruinadas.

As causas elencou-as com incisão o Professor Santana Castilho, em artigo no jornal «Público» de 08 de Dezembro, de modo compreensivelmente incompleto, como o próprio refere.

Como se constata, em Portugal todos sabem como se dá aulas, excepto os professores que as dão. E não faltam “teóricos” que, todos os anos, arranjam maneira de dar mais uns rombos na precária condição dos docentes ao invés de os ajudarem a dar boas aulas e a ensinar os alunos. Este ano surgiu mais uma «burlantinice» (o neologismo é meu) a que chamaram «Projeto Maia». Os pais da coisa e os discípulos que se esfalfam a promover a sua aplicação pelas escolas implicam com os testes escritos aplicados aos alunos e, vai daí, insistem em que é preciso diversificar os processos e estratégias de avaliação (o que é verdade), mas reduzindo muito o peso daqueles instrumentos na avaliação. Idealmente, talvez, de acordo com o que se vai propalando, até acabar com eles. Quando se aplicam, os testes devem contemplar diversos domínios, os quais, se mais ou menos definíveis numas disciplinas, são artificiais, aleatórios, sobreponíveis e inúteis ou inaplicáveis noutras. Enfim, uma salgalhada que se desdobra em extensas e desconformes grelhas de “excel”, de que deve resultar que os alunos obtenham uma notação positiva. Em muitos casos, há indicação clara de que o valor inferior da escala nem pode ser usado, mesmo que algum aluno não apareça nas aulas. Claro que ninguém antecipa o que possa vir a ser o desempenho dos alunos em exame nem nas participações nos programas internacionais como o PISA ou o TIMMS (excepto uns quantos professores, mas esses não contam, obviamente). E de que os professores serão então culpados. Esta metodologia, tida por justa e boa, engloba o secundário.

Quanto aos meus alunos mais pequeninos, lá está a doce ternura da pré-adolescência, mas também a matreirice e a tendência para a batota, que as crianças tão bem aprendem com o exemplo dos adultos. Tudo normal, por esse lado. Porém, o que mais (me) dói é que muitos, que são vivos e inteligentes, não sabem ler adequadamente e menos ainda conseguem alinhar coerentemente uma ideia em três linhas escritas.

Procurei, por outro lado, não descurar a necessária formação e actualização. Por isso, para além do “excel”, frequentei todas as lições que o Professor Galopim de Carvalho deu, à distância, aos sábados, das 18 às 19 horas, no mês de Outubro e Novembro, até ontem, e que vai continuar a partir do Ano Novo. Com os seus 90 anos, ele sim, ajuda efectivamente os professores. O Professor Jorge Paiva é outro com quem os docentes do ensino básico e secundário podem contar. Limitei-me a dois exemplos por serem os de mais idade, em registo de agradecimento e homenagem.

Feliz Natal.

José Batista d’Ascenção 

sábado, 25 de setembro de 2021

Incumprimento da redução do tempo lectivo dos professores com mais idade - queixa à Provedora de Justiça

Razões: incumprimento do estabelecido no ponto 1 do artigo 79.º (redução da componente lectiva) do Decreto-Lei nº 41/2012, de 21 de Fevereiro.

É prática das escolas colocar os professores com redução da componente lectiva nas chamadas “bolsas de professores de substituição”, em que, como o nome indica, substituem outros professores nas faltas que estes eventualmente dão. E então, os professores incluídos nas bolsas de substituição, que cumprem a sua componente lectiva, nos termos da lei, são, frequentemente, chamados a executar aulas de substituição, com a totalidade dos alunos de turmas que não são suas, nos tempos lectivos em que outros faltaram: ou seja acrescentam tempos de actividade lectiva aos tempos da componente lectiva que a lei estipula para si próprios, assim se violando, em seu prejuízo, o disposto na lei. Dito (ainda) de outro modo: a redução da componente lectiva a que têm direito, na realidade pode não existir.

Esta prática generalizou-se nas escolas e nem os órgãos de direcção, de coordenação e pedagógicos, com destaque para os conselhos pedagógicos, têm tido acções dignas de nota no sentido de respeitar o cumprimento da lei. Também não se pronunciam sobre o facto as hierarquias do Ministério da Educação, nem a Inspecção Escolar, nem esta matéria é significativamente abordada pelos sindicatos e nem mesmo os professores, especialmente os afectados, contestam a situação de abuso e prejuízo em que são colocados.

Naturalmente, os professores com redução da componente lectiva, que são os de mais idade, podem e devem realizar trabalho de apoio a alunos, que é essa, ou devia ser, a sua nobre missão, a qual lhes dá muito gosto, mas individualmente ou em pequenos grupos (dois a seis alunos, digamos), em espaços adequados e dignos.

O que se verifica é indigno, ineficaz e prejudicial porque:

- a maior parte dos alunos odeia ostensivamente as «aulas de substituição» e recusa-se a trabalhar nelas, não dissimulando sequer a sua hostilidade aos professores de substituição;

- os professores de substituição raramente conseguem fazer qualquer coisa de útil nestas «aulas de substituição», ficando, na prática, na situação de guardadores de meninos que, vulgarmente, ficam imersos nos seus apetrechos digitais, à espera que o tempo passe…

- um professor de uma disciplina, digamos de Português, é muitas vezes chamado para ir substituir um de uma disciplina diferente, suponhamos de Educação Física, tendo como espaço para a substituição o local/sala em que a aula normal decorreria (na nossa suposição, um pavilhão desportivo ou o recreio…), que pode não ser minimamente adequado para a acção que o professor substituto poderia desempenhar de modo proveitoso para os alunos e gratificante para si;

- o regime de substituição de professores faltosos, tal como funciona, diminui e enxovalha os professores, é um mau exemplo, e prejudica a disposição e energia dos professores (com idade e direito a redução da componente lectiva) para trabalharem com os seus alunos de todos os dias. Não se pode esquecer que a maior parte dos professores das «bolsas de substituição» tem idade na casa dos sessenta anos ou a passar disso, mas vão estar ao serviço por mais meia dúzia de anos ou quase, pelo que, respeitá-los e preservá-los, é uma boa opção, por todos os motivos.

Como nota final, acrescento que esta exposição não é uma acusação limitada à escola em que presto serviço, antes uma informação fidedigna, de fonte com rosto, do que se passa em muitas escolas de Portugal continental sobre matéria que exige análise e remediação.

Resultado esperado: Acção da Provedora de Justiça junto do Governo, do Ministério da Educação e do Agrupamento de Escolas Carlos Amarante. E além disso:

Saber que procedimento em sua defesa podem ou devem os professores com direito a redução da componente lectiva adoptar para verem respeitada a lei estatutária cuja letra os protege. 

Braga, 25 de Setembro de 2021

José Batista da Ascenção

quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Prestes a recomeçar as aulas

Após a habitual saturação com reuniões penosas, para dar conta de exigências burocráticas formais, basicamente inúteis, cá estamos para o que interessa: dar aulas e ensinar alunos.

Porque estou (mais) velho, os condicionalismos legais da componente lectiva determinam que volte a ter alunos do ensino básico, mais de vinte anos depois. São meninos de 7º ano de escolaridade, com cerca de 12 anos.

Estou com medo. Medo de não ser suficientemente capaz de estimular (ou até de fazer murchar ou matar!) neles o gosto de aprender. Quando dei aulas a alunos destas idades achava-lhes graça e sentia ternura pela inocência e curiosidade daqueles passaritos, regra geral, receptivos às normas e disponíveis para o trabalho. Vejo-os e recordo-os com os olhos e os sentimentos de então, ou disso estou convencido, mas as crianças que vou encontrar são de outro tempo e vêem-me, seguramente, de modo(s) bem diverso(s) do que supunha na altura, e procuro imaginar, agora.

É um desafio enorme. Sinto-me à prova, perante eles, perante mim e não apenas.

Com os maiorzinhos nem dou pela preocupação. Ou ela está camuflada pela expectativa em relação aos mais pequenos.

Vamos ver como corre.

Desejo-me felicidades.

José Batista d’Ascenção

quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Regresso à Escola


«Regresso às aulas», por Carlos Fiolhais, in: jornal «Público», Excerto de artigo na página 8, da versão impressa.

«A escola é a mais útil das invenções da Humanidade, uma vez que é ela que, ao longo do tempo, lhe tem garantido o futuro. Pode o pai não saber artes ou a mãe não saber matemática, mas a escola, da qual os professores são o imprescindível núcleo, tem por obrigação transmitir o melhor da herança humana. É a continuação da Humanidade que tem lugar sempre que professores e alunos voltam às aulas em Setembro.

(...)

Os meios tecnológicos não passam de quinquilharia, que será um dia substituída por outra. O essencial da escola não mudou nem pode mudar: é o contacto criativo e fértil entre professores e alunos, que prepara estes para a vida. Esquecendo o essencial, hoje em dia impera a miragem tecnológica: a preocupação do Governo na área da educação é fornecer miríades de computadores. Ele pensa que o pagamento aos quinquilheiros o dispensa da sua missão de fomentar o processo profundamente humano que deve ocorrer na sala de aula. Mas é aí que, com consciência humanista, começa o futuro.

(...)

Que podem fazer os professores? Não é fácil, dada a subalternidade a que têm sido remetidos, mas têm de resistir em nome da Humanidade de que são guardiões. Não só podem como devem continuar a dar o melhor de si aos seus alunos. Fala-se muito dos “heróis” do SNS, mas há também campeões nas nossas salas de aula, que dão triplos saltos sem receberem encómios. É a eles que quero saudar, louvando-os e encorajando-as, neste regresso às aulas.»

Muito obrigado, Professor Carlos Fiolhais.

Afixado por: José Batista d'Ascenção

quarta-feira, 4 de agosto de 2021

Questionários de exame do IAVE – que credibilidade?

Socorro-me de dados do jornal "Público" (edição de ontem):

O ano passado a nota mais havida no exame de Matemática A foi 19 valores. No exame deste ano, a nota mais frequente foi 10 valores. O número de alunos com nota inferior a 9,5 valores aumentou 71%. O ano passado, o total de alunos com nota igual ou superior a 18 foi de 24,7%. Este ano foram apenas 8,9%

No exame de Biologia e Geologia deste ano (a prova mais concorrida, realizada por 36.517 alunos), as negativas aumentaram 82% relativamente ao ano passado. O ano passado, a percentagem de alunos com nota igual ou superior a 18 foi de 11,8%. Este ano reduziu-se para 2,8%.

Em Física e Química houve este ano um aumento de negativas de 68% relativamente ao ano anterior. O ano passado, os alunos com 18 ou mais totalizaram 19,8%. Este ano ficaram-se por 3.6%. 

Em subtítulo do artigo do «Público» pode ler-se: “Iave confortável”. O presidente da instituição confirma, ao considerar que os resultados dos exames dão “boas indicações sobre a adequação das decisões técnicas implementadas nas provas, tendo em consideração a situação lectiva vivida no presente ano escolar”…

Dá para acreditar?

José Batista da Ascenção

PS: Este texto está publicado no jornal "Púbico" de hoje. 

terça-feira, 27 de julho de 2021

Sobre a (imparável) sucessão de reformas do ensino básico e secundário (neste caso de matemática)

Por João Nuno Tavares, Professor associado aposentado, do Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Excerto de artigo no jornal «Público» de hoje [pg. 27 da versão impressa]


[…] «Têm as comunidades científicas dado contributos substantivos que ajudem a superar uma eventual impreparação científica dos docentes?

E os exames? Como se avalia o sistema? Através de diretrizes ministeriais, despachos normativos e uma burocracia asfixiante, descrita num dialeto difícil de decifrar, que sistematicamente invade as escolas, pressionando, muitas vezes de forma pouco disfarçada, no sentido de “dourar” resultados e estatísticas, para inglês ver! Os exames são o único meio de avaliar se um sistema funciona ou não. Pode ser essa a sua principal missão, sobretudo nos níveis mais básicos de aprendizagem. Aboli-los é um crime de consequências imprevisíveis. E que se acabe de vez com a ideia de que ensinar e aprender têm de ser atos lúdicos. Não há aprendizagem sem sacrifício, sem dor, sem conquista. Pare-se de vez com o chavão lúdico à força, que muitas vezes roça o ridículo, o caricato, a palhaçada. Aprender exige disciplina, esforço, repetição, aquisição de mecanismos e, finalmente, avaliação. Afirmar o contrário, pior, implementar o contrário, é criar seres indigentes, incultos, sem referenciais éticos e humanistas, num mundo cada vez mais carente desses valores, para fazer face aos enormes desafios que a atualidade coloca ao planeta e à própria sobrevivência da espécie.

Grandes artistas, músicos, poetas e outros criadores começaram por copiar os seus antecessores, imitando-os pura e simplesmente para dominar as técnicas já experimentadas e validadas. E só depois se emanciparam. A aprendizagem é cumulativa e só depois poderá ser (consistentemente) disruptiva. O solfejo aprende-se de forma automática, não de forma racional e muito menos lúdica. E não há músico, compositor ou executante que não o use…» […]

Afixado por: José Batista d’Ascenção

quinta-feira, 22 de julho de 2021

Ensinar sem programa(s)

Ensinar com maus programas é difícil, mas sem eles não é mais fácil.

Por despacho (n.º 6605-A/2021, de 06 de Julho) os programas que havia das diferentes disciplinas deixaram de vigorar. As orientações programáticas relativas aos conteúdos de cada disciplina restringem-se agora às “aprendizagens essenciais» que incidiam sobre os programas revogados. Na disciplina de biologia e geologia do ensino secundário limitam-se a escassas 11 páginas, em cada ano (incluindo a introdução de 2 páginas em cada), cujo conteúdo é, em grande parte, banal e genérico.

Como planificar e orientar o ensino assim? Não é difícil que as escolas passem a divergir grandemente nas planificações e nas estratégias lectivas. E, nos casos de disciplinas com exame nacional, mais ainda do que já acontece, os professores vão, provavelmente, orientar-se mais pelo que supõem que possa sair em exame do que pelas parcas e vagas linhas programáticas, o que é uma inversão do que seria desejável. Ou seja: o IAVE passa a ser a entidade “definidora” (mesmo que involuntariamente) e condicionadora da actividade lectiva.

Era (d)isto que precisávamos?

Sempre fui defensor dos exames nacionais. Mas não assim.

PS: Este texto está hoje publicado no jornal «Público».

José Batisa d’Ascenção

segunda-feira, 12 de julho de 2021

«Para que servem estes exames? Para que serve o Iave?»

«Para nada».

Perguntam e respondem os professores de física e química A (do ensino secundário), Carlos Portela e Maria José Varela, em artigo muito sério, no jornal «Público» de hoje (pg. 8 da versão impressa).

Este texto devia ser de leitura obrigatória para todos os cidadãos portugueses com mais de dez anos capazes de o fazer.

Felicito os autores, a quem agradeço. Apesar de não concordar com a resposta, porquanto, exames assim causam injustiça na avaliação dos alunos e descredibilizam a Escola, particularmente os professores, o que é (ainda) pior do que "não servir para nada". Já nem falo do papel ingrato dos docentes "correctores" que são obrigados a trabalhar para o "funil" de ingresso no ensino superior, como se essa devesse ser uma função sua. E muito menos me queixo da ausência de qualquer remuneração para tal trabalho, ao contrário do que foi prática durante muitos anos.

José Batista d'Ascenção

sexta-feira, 2 de julho de 2021

Sucesso escolar em tempos de pandemia – a principal razão

 

O jornal «Público» noticiava ontem (pg. 15 da versão impressa) que os resultados escolares melhoraram nos últimos dois anos. O “sucesso” «bateu recordes». Nada que (me) espante. As razões do facto são (bem) apontadas por Paulo Guinote, professor do 2º ciclo do ensino básico, e (mal) pelo presidente da Associação Nacional de Directores de Escolas Públicas (Filinto Lima), que recusa a ideia de facilitismo (que ideia!) e (menos mal) pelo director da Escola Secundária de Camões (João Jaime), em Lisboa.

A meu ver falta o factor principal, que é… a (nossa) falta de rigor.

Quem (como eu) participa nos conselhos de turma (reuniões de avaliação) assiste ao característico apelo ao “bom senso” e à insistência (“pedagógica”) em que se tenha em conta a situação vivida pelos alunos, motivo por que que a avaliação não deve “prejudicá-los”. Enfim, um certo discurso de comiseração (para mim uma ladainha) que deixa de lado a devida objectividade, porquanto:

- os professores ensinaram pior (pelo menos eu);

- os alunos aprenderam menos;

- os dados da avaliação à distância não são fidedignos, como todos sabem, embora haja quem prefira negá-lo;

- os exames do ano passado (os que houve) foram chocantemente facilitistas [na realidade mal feitos, o que não significa que os dos anos anteriores, pelo menos os de biologia e geologia, fossem bem elaborados e conformes com os programas (eles próprios muito discutíveis…)].

As “notas”, portanto, só podiam subir.

Ironicamente, podíamos (até) dizer que, se a pandemia continuar, resolve(re)mos o problema do insucesso. À nossa maneira, claro.

José Batista d’Ascenção.

PS: Este texto está publicado no jornal «Público» de hoje.

domingo, 20 de junho de 2021

Melhorar o funcionamento das escolas e ocupar os alunos em tempo de férias

Menos produtivas do que deviam, pelas razões conhecidas, as aulas chegaram ao fim ou estão prestes a terminar. Exceptuando os alunos que vão fazer (alguns) exames, para a maior parte (e mesmo para esses) aproxima-se um longo período de férias. São as férias grandes, que muitas opiniões consideram demasiado grandes. E são. Mas, alargar o calendário de aulas, face às nossas condições climatéricas e ao modo como nos organizamos, não seria muito avisado.

Para os jovens e para as famílias é um problema. Minorá-lo devia fazer parte das preocupações do Ministério da Educação. Como o ensino público não sabe bem o que quer (a despeito da formulação de boas intenções e da enunciação nítida de princípios básicos que consta de alguns documentos legais), muito por causa do vasto entulho “filosófico-discursivo” de leigos e especialistas, seria ideal que, gozando de verdadeira autonomia, cada escola e cada comunidade educativa pudessem aclarar (em linguagem simples, exacta e sucinta) as suas metodologias preferenciais e preferidas, de modo a facultar a encarregados de educação e a alunos do ensino secundário as opções pretendidas entre escolas e currículos. A amálgama em que funcionamos tem o efeito prático de uma roleta (não isenta de vício) que frustra muitos e dá prazer a (relativamente) poucos (normalmente os que podem). Ou seja: a escola frequentemente desagrada e repele, em vez de atrair.

Por outro lado, os estabelecimentos de ensino, mais do que matraquear burocracia, deviam disponibilizar os seus espaços e instalações nos períodos não lectivos para diversas actividades ou projectos não dependentes dos docentes, como os dos Centros Ciência Viva e de outras organizações (culturais, desportivas, de lazer, de saúde, de ecologia, de solidariedade…) capazes de ocuparem as crianças e os jovens em experiências estimulantes e formativas.

Esperar que os professores, enquanto professores, substituam os pais (que muitos deles também são) é que não é possível. Nem desejável.

José Batista d’Ascenção

terça-feira, 15 de junho de 2021

Acerca da duração do ano lectivo em Portugal

Existe no nosso país a ideia de que são poucos os dias de aulas de cada ano lectivo (e de que os professores trabalham, vulgarmente, pouco). Não é por acaso. Se é razoável e justo é outra matéria.

O número de aulas por dia e por semana, visto na perspectiva dos alunos não parece pouco nem pequeno. Na minha também não. E é de todo improdutivo que crianças e jovens entrem às 08.20 h da manhã e acabem às 13.20 h. Ou que iniciem uma tarde de aulas às 13.30 h e a terminem às 18.30 h. Fora os dias em que têm aulas de manhã e de tarde. Creio que em poucas profissões de adultos (legalmente reguladas) se trabalha(rá) num tal regime, no país.

Carga horária total em horas da escolaridade obrigatória. (*)
Como obter rendimento, então?

Um dos motivos (reais) por que se quer alargar o calendário de aulas prende-se com a necessidade que os pais sentem de que alguém se ocupe dos seus filhos. É compreensível. Mas, exigir dos professores aquilo para que eles não servem e não reclamar a disponibilidade das instalações escolares para o que muito bem poderiam servir, para além das aulas, é uma pena: porque perdem todos.

Habitualmente, recorre-se à comparação com o que se passa noutros países situados (mais) a Norte… Contudo, não se atenta em que, quando a temperatura se eleva a 35ºC ou mais, não é simplesmente possível que 28 alunos e o professor encafuados numa sala de aulas, que computador e projector ligados aquecem ainda mais, realizem qualquer trabalho útil. E, nas escolas que têm algum sistema de ar forçado, se o mesmo fosse ligado, não havia capacidade financeira para pagar a conta de energia no final do mês, descontando eventuais crises de alergias e outros problemas respiratórios em não poucos casos…

Impressiona, por isso, que não se tomem em conta “pormaiores” tão básicos quando se reclama o que parece linear, mas que é inviável. E que seria facilmente resolvível com outra organização e outros objectivos.

Tanto mais que o trabalho voluntário dignifica qualquer um.

José Batista d’Ascenção

(*) Inhttps://www.ffms.pt/FileDownload/34bcf694-4883-41ee-ad4b-6a77786c0c29/os-tempos-na-escola (pg. 25/75 ou 29 na numeração do documento)

quinta-feira, 10 de junho de 2021

Planos de recuperação de aprendizagens - quantos?

Este ano lectivo e o anterior foram muito perturbados pela interrupção das aulas presenciais e pela ilusão da eficácia do ensino à distância.

Nas disciplinas de biologia e geologia (do ensino secundário), a componente laboratorial, mesmo com as insuficiências habituais, ficou comprometida em prejuízo dos alunos.

Assim mesmo, a perda destas e de outras aprendizagens tem consequências dramáticas? Em minha opinião, não.

Pior do que as falhas havidas, que são reais, são os problemas estruturais crónicos e endémicos do sistema de ensino, que vamos camuflando com remendos sobre remendos e compondo com estatísticas de trazer por casa, quais “cancros” tratados com improvisos e mezinhas de eficiência nula. Tantos são, e entre eles:

- programas mal concebidos, já desactualizados antes ainda de entrarem em vigor, há duas décadas ou quase. Como o de 10ºano, na parte de biologia. Não se percebe porque é que ninguém quer mexer naquela relíquia…;

- a falta de prioridade a conteúdos lectivos determinantes para a compreensão do mundo, da vida e da história. Não são poucas as escolas em que tudo parece ser mais importante do que a aprendizagem que devia ter lugar nas salas de aula;

- o reconhecimento da imprescindibilidade de normas claras e universais de disciplina e de serenidade nas escolas;

- a sobrecarga de actividades burocráticas dos professores, cuja função devia (con)centrar-se nas tarefas de ensinar alunos (vejam-se as longas ordens de trabalhos das convocatórias dos conselhos de turma e a “língua de pau” dos extensos conteúdos das respectivas actas);

- as enchentes de «mails» das mais diversas proveniências (direcções, serviços do ministério, centros de formação, editoras, encarregados de educação; alunos, etc.), todos os dias úteis, sábados, domingos e feriados, a qualquer hora do dia ou da noite, como se os professores não tivessem mais que fazer;

- o descrédito das avaliações dos alunos, dos professores e do funcionamento das escolas;

- o vazio de conteúdo (e de orientações concretas e úteis) das «aprendizagens essenciais» em documentos distintos dos velhos programas, surgidas tarde e mal, quando, muito bem redigidas e articuladas,  deviam integrar programas novos;

- a concepção de exames para os quais o cumprimento estrito do programa (de biologia e geologia) não prepara(ria) convenientemente os alunos;

Etc.

Não precisamos de planos de recuperação sucessivos e sobrepostos, mais formais que funcionais. Bastariam condições mínimas que não esgotassem energias e recursos nem matassem o gosto de trabalhar.

José Batista d’Ascenção

sábado, 22 de maio de 2021

«A biodiversidade e nós»

Pergunta o Prof. Jorge Paiva (hoje, no jornal «Público», páginas 46-47 da versão impressa):


«Será que estamos a evoluir para uma nova espécie de Homo com a comida industrializada»?



E esclarece, essa e outras questões.


«A alimentação industrializada está a reduzir as espécies que comemos.


Inconscientemente, pode julgar-se que não é necessário preocuparmo-nos com a preservação de todas as espécies, mas apenas com aquelas que nos são úteis. Há muitos exemplos que nos obrigam a actuar no sentido de preservar todas as espécies indistintamente.»







Afixado por: José Batista d'Ascenção

sexta-feira, 21 de maio de 2021

A propósito de “rankings”


No jornal Público de hoje, o seu director, Manuel Carvalho, escreve, a propósito dos “rankings”: «O que estes resultados nos mostram ao longo de 20 anos é que a distância entre a qualidade do ensino dos filhos das famílias mais ricas e a do que é ministrado à generalidade das crianças e jovens está a aumentar.»

Para além da natural exigência de que as escolas ensinem bem os alunos, que é para isso que elas deviam servir, que tal a política dos governos ter por objectivos criteriosos aumentar a capacidade económica do país e diminuir o número de pobres e o grau de pobreza das famílias sem posses?

A não ser assim, e se as escolas não forem espaços de disciplina e de um mínimo de entusiasmo, não há pedagogia de efeito universal que (nos) salve, embora possamos sempre compor umas estatísticas “suavizadas”.


José Batista d’Ascenção

sexta-feira, 14 de maio de 2021

(I)Lógica dos programas e dificuldades na aprendizagem

Exemplo da disciplina de biologia de 10º ano

As unidades programáticas de biologia de 10ºano, além de falhas de actualização científica, algumas já notórias à data da sua homologação, em Setembro de 2001, e da falta de definição e de concretização de várias das suas rubricas, por muito que o professor “navegue” entre o que se manda «enfatizar» e «evitar», numa espécie de “nevoeiro” conceptual que a formulação de «aprendizagens essenciais» (em Agosto de 2018) não dissipou minimamente, sofrem ainda de grande artificialismo e arbitrariedade casuística no que devia ter forte e fluida articulação. Ou seja, falham também na pedagogia.

A unidade um (que se segue à unidade zero) tem por linha definidora a «obtenção de matéria». Ali cabem os sistemas membranares das células, os fenómenos das (mais variadas) digestões e a fotossíntese. Não é pouco nem restrito nem bem inter-relacionado. Engole-se.

A unidade dois, sob o tema «distribuição de matéria», alberga o transporte/circulação de fluidos nas plantas e na imensa variedade dos animais. É suposto que os alunos se interessam e motivam por aqueles processos fisiológicos e se inteiram de não poucas das suas minudências e correlações. Não se pode dizer que as propostas pequem por falta de ilusória ambição. Recordo-me de que apenas estudei transporte nas plantas no segundo ano da faculdade…

Na unidade três, o tema é a «transformação e utilização de energia pelos seres vivos». Aqui cabem as fermentações (alcoólica e láctica), em quaisquer seres vivos em que ocorram, e a respiração aeróbia. Na segunda rubrica desta unidade manda-se abordar as «trocas gasosas em seres multicelulares» (em plantas e animais). Como se a fotossíntese, dada na unidade um, não fosse (também) um processo notável de troca de gases: consumo de dióxido de carbono (CO2) e libertação de oxigénio (O2). Ou como se a ascensão de água nas plantas, tratada na unidade dois, não fosse essencialmente uma consequência da transpiração nas folhas, em que as plantas libertam por evaporação mais de 99% da água que absorvem pelas raízes.

A extensa quarta unidade, intitulada «regulação nos seres vivos» (animais e plantas), foi drasticamente podada pela publicação das «aprendizagens essenciais», o que reduziu o programa, e ainda bem, mas deixou-se o «impulso nervoso» sob a recomendação de ser abordado em relação com os transportes através da membrana, da unidade um.

Que coerência tem um programa assim? Que lógica poderá fazer na cabeça dos jovens alunos? A articulação harmoniosa de todos estes conteúdos pode ocorrer na mente de quem já sabe as matérias (em biologia, todos os assuntos podem ser relacionados com quaisquer outros) mas o mesmo não é válido para os alunos.

Sobram, então, algumas perguntas simples: porque se elaborou um programa como este? E, principalmente, porque não se muda (e dura há tanto tempo)? Ainda agora se vão adoptar novos manuais seguindo estes arcaísmos programáticos.

Respondam as capelinhas que decidem por nós. Clareza precisa-se. E não apenas.

José Batista d’Ascenção

domingo, 2 de maio de 2021

Pedagogias novas que são velhas – o exemplo da «gamificação»

Tendo-me chegado pelos CTT dois «packs» de manuais e materiais inerentes (de 7º ano), que agora se chamam «projetos», com vista à adopção para o próximo ano lectivo e seguintes, impressiona-me a quantidade de instrumentos, na sua abrangência, profundidade, variedade e completude. Os colegas autores realizam um trabalho que se me afigura violentamente exigente.

A nível do 10º ano de escolaridade, face aos programas (de biologia e geologia) existentes, e ao tipo de exames nacionais que têm sido feitos, outras dificuldades se me deparam, as quais não abordarei aqui, porque são extensas e também  porque (ainda?) não tenho em mão as  novas propostas (em papel) dos ditos «projectos».

Num dos «packs» recebidos, detive-me numa parte que baptizaram de «gamificação». O conceito, que explora a importância do jogo em pedagogia, está na moda. Será uma inovação?

Lembrei-me do livrinho «Da Educação», de Almeida Garret, impresso em 1829 (fac-símile editado pelo jornal «PÚBLICO»), e fui reler, nas páginas 76-77: «Não sou grande apaixonado por um methodo de ensino que tem prevalecido pela Europa e que tanto recomendou Madame de Genlis – fallo do ensino primario por meio de brincos e bonitos. Digo que não sou apaixonado do excesso a que se tem levado, porque usado com moderação e prudencia, póde ter bons resultados.»

Partilho da opinião. Quem está no activo (leia-se: os professores que dão aulas) esfalfa-se  no uso de metodologias salvíficas que (supostamente) vão ao encontro da motivação das crianças, e que,  no final, (nos) fazem passar frustrantemente ao lado. Depois, em vez de reconhecermos que falhámos, tendemos a gabar as opções tomadas e infla(ciona)mos as classificações para compor estatísticas (amiúde caseirinhas).

Que importam lá constatações como esta: «Com base nos resultados do PISA de 2018, as reformas do ensino e o aumento da despesa na educação não garantiram “uma melhoria real nos níveis de desempenho dos estudantes” nos últimos 20 anos sem covid-19.» [in: jornal «Público» de 05 de Abril de 2021, pg 14. Últimas linhas do artigo intitulado «Professores prioritários para vacina em dois terços dos países da OCDE», da autoria de Ana Dias Cordeiro.]

Como as crianças não nascem estragadas, e como o conhecimento tem beleza intrínseca, creio que continuamos a “nadar” na educação e ensino de meninas e meninos, que eu admito que, com demasiada frequência, talvez achem os adultos bastante… infantis.

José Batista d’Ascenção

quinta-feira, 29 de abril de 2021

O falhanço do ensino à distância é maior (ainda) do que eu receava

Imagem obtida aqui.
Disponho já de dados (mais) concretos e específicos (relativamente aos meus alunos). Apliquei (os tradicionais) testes escritos (em papel, claro) nos dias de reinício das aulas presenciais do ensino secundário (na semana passada), “corrigi-os” entretanto (acabei há bocadinho), fiz ontem a entrega e discussão com alguns alunos e fá-la-ei amanhã com outros.

Verifico que os bons alunos e os que (suspeito que) têm algum apoio (ou são mais activos a solicitar-mo a mim…) se aguentam, mas os restantes “afundam-se”. Esta constatação era, de algum modo, previsível, mas não é menos amarga por isso.

Agora, empenho-me quanto posso em incutir-lhes confiança e resiliência. Parecem-me receptivos à mensagem (ou, pelo menos, não refractários). Espero que não desistam de conseguir. E de trabalhar para isso.

Donde, não são pequenas, nem simples, nem fáceis as tarefas das semanas que restam até ao término das aulas.


José Batista d’Ascenção

quinta-feira, 22 de abril de 2021

Ensinar sem truques falsos nem ficções ilegítimas

Pelo Centro de Ciência Viva de Estremoz

Hoje, na Escola Secundária Carlos Amarante – Braga, resumidamente, os temas tratados foram os seguintes:

- Do ciclo das rochas ao ciclo tectónico;

- Das ondas sísmicas à estrutura da Terra;

- Da tabela periódica aos minerais e à idade da Terra.

As relações da Terra com a geologia, com a física e com a química, respectivamente, foram postas em evidência por três jovens investigadores, com materiais na sua maior parte inventados por eles: modelos, estruturas, dispositivos, instrumentos, representações figurativas, ou objectos sabiamente aproveitados, através dos quais chamaram os alunos à participação. E com grande sucesso. Servidos por uma boa capacidade pedagógica, associada à necessária solidez científica, logo cativaram a miudagem, todos de 10 º ano. Em cada um dos espaços sucederam-se as turmas, uma de cada vez, com os alunos sempre motivados.

Vários ensinamentos a extrair, também pelos professores. Os Drs Alexis, Francisco e Mário não precisaram de computadores, nem de telemóveis, nem de projector, nem sequer de corrente eléctrica. Os alunos também não lhes deram pela falta.

Valeu muito a pena.

Sentida gratidão. Só para que conste.

José Batista d’Ascenção

segunda-feira, 15 de março de 2021

Como os alunos não podem aprender o que consta de alguns programas escolares

Um exemplo: a coerência, a sequência e a articulação dos conteúdos da segunda parte da unidade 0 e da primeira parte da unidade 1 do programa de biologia de 10º ano


Há mais de um mês comecei a batalhar no estudo dos constituintes celulares com as minhas turmas de 10º ano de escolaridade. À distância as coisas são ainda mais difíceis, porque as aulas práticas de microscopia, sempre aliciantes, só são possíveis no laboratório. Descritos sumariamente os tipos de células propostos e os seus organelos, descemos ao nível dos constituintes químicos com referência ligeiríssima às substâncias inorgânicas (água e sais minerais), para nos demorarmos um pouco mais nos compostos orgânicos (prótidos, lípidos, glícidos e ácidos nucleicos). Como a generalidade dos alunos trazem noções rudimentares de química dos anos anteriores, e nem todos nem a maior parte, a “assimilação” é, para a maioria, muito problemática.

Na unidade 1 entra-se com o estudo da membrana das células. A sua ultraestrutura, a composição, as propriedades dos constituintes e, por consequência, as suas caractérísticas e funções. De seguida, os tipos de transporte através ou envolvendo a membrana e o modo como se processam. E aqui tudo bem. Há coerência. O resto seria trabalho.

Mas eis que, das membranas, se passa para a digestão intracelular, como se a relação fosse directa e consequente, logo facilmente apreensível. Daqui segue-se, em velocidade, para o estudo da evolução dos aparelhos digestivos dos animais, dos mais simples para os mais complexos [sendo de «evitar o estudo pormenorizado da morfofisiologia dos sistemas digestivos» (pg. 80 do programa). Pudera!], terminando no ser humano, no que seria retomar e ampliar o estudo realizado no nono ano. O artificialismo e a abrangência são notórios e a rapidez com que tudo se dá prejudica seriamente a apreensão rigorosa (e mínima) dos conceitos implicados e das suas múltiplas relações. Como se fosse pouco, sobra outra dificuldade. O papel dos catalisadores biológicos ou enzimas, surgido a propósito da digestão. Este estudo poderia ter sido introduzido atrás, aquando da referência às diversíssimas funções dos prótidos, no fim da unidade anterior, ou agora, no reforço do papel e da importância das enzimas digestivas. Porém, o programa da disciplina, relativamente às enzimas, apenas propõe «recordar e/ou enfatizar as funções principais das macromoléculas (estruturais, energéticas, enzimáticas, armazenamento e transferência de informação)» [pg. 79]. E a «operacionalização das aprendizagens essenciais» um documento que devia ser esclarecedor, repete: «caracterizar biomoléculas (prótidos, glícidos, lípidos, ácidos nucleicos) com base em aspetos químicos e funcionais (nomeadamente a função enzimática das proteínas), mobilizando conhecimentos de química (grupos funcionais, nomenclatura)» [pg. 8].

Perante isto, um humilde professor da disciplina faz, há muitos anos, esta pergunta simples: afinal, o que é que se deve dar sobre enzimas? Mas nunca encontrou quem lhe respondesse.

Nem a esta pergunta nem a uma infinidade de outras, de igual pertinência.

José Batista d’Ascenção

sábado, 13 de março de 2021

Tantos (os) que precisam(os) de apoio – e de compaixão

Excerto de um maravilhoso texto de António Barreto, no jornal «Público» de hoje – a parte relativa aos professores, apenas tão bela e merecida como as restantes (que englobam toda a gente.) 

[…]

«Professores, docentes e educadores precisam do nosso apoio. Com ou sem alunos, com e sem aulas presenciais, com e sem computadores e sistemas, estes profissionais viveram um ano inesquecível de sofrimento e exaustão, de riscos e incertezas. São eles a quem se entregam os maiores valores das nossas vidas, os filhos. São eles os primeiros de quem nos queixamos quando a falta de meios, a desordem legislativa, a paranóia regulamentar, a enxurrada de directivas, a obsessão dos despachos normativos e a turbulência mental de um ministério desnorteado perturbam a nossa vida colectiva.» […]

Sentidamente grato:

José Batista d’Ascenção

terça-feira, 2 de março de 2021

Membrana celular e sistema endomembranar (II)

Texto destinado a alunos do 10º ano de escolaridade, motivo por que procura seguir as regras ortográficas de 1990

Imagem obtida aqui.

As vesículas endocíticas, caso contenham substâncias a digerir, movem-se no citoplasma ao encontro de outras vesículas cujo conteúdo é formado por enzimas digestivas (as quais têm de estar contidas, senão atacavam, por hidrólise, os próprios componentes celulares…). Essas vesículas são chamadas lisossomas. Da fusão entre as duas entidades resulta uma vesícula maior, designada vacúolo digestivo, em alusão à sua função. Após a digestão, as partículas mais simples, podem então atravessar a espessura da membrana e passar para o citoplasma, onde vão ser utilizadas.

Os lisossomas são originados em organelos membranares que formam o Complexo de Golgi (CG). Esta estrutura corresponde a uma série de conjuntos de sáculos achatados e empilhados (dictiossomas), sendo que cada conjunto cresce por coalescência e fusão de vesículas com conteúdo provenientes de estruturas próximas como a rede de cisternas membranares que se distribuem pelo citoplasma e que se designa Retículo Endoplasmático (RE). Na zona oposta de cada dictiossoma formam-se abundantes vesículas a partir dos sáculos, com os produtos maturados (enzimas, glicoproteínas, e polissacarídeos, por exemplo), cujos destinos são os diferentes locais da célula ou o exterior.

Quando ao RE se associam ribossomas, organelos não membranares que unem aminoácidos em cadeias proteicas (mediante ligações peptídicas), segundo uma ordem específica (estrutura primária de cada proteína), a face membranar virada para o citoplasma apresenta-se rugosa nas observações ao microscópio, pelo que a esse retículo foi aposto o nome de Retículo Endoplasmático Rugoso (RER). O RER acondiciona temporariamente e faz distribuir as mais diversas proteínas para os seus destinos, em particular o CG. O trânsito destas proteínas faz-se no interior de vesículas que se formam e destacam do retículo, migrando até se fundirem com a membrana da face mais próxima de cada conjunto de sáculos do CG (face de formação). 

Há extensões do Retículo Endoplasmático que não estão estreitamente associadas a ribossomas. Nestes casos, não apresentam um aspeto rugoso, nas observações ao microscópio, pelo que se lhe chama Retículo Endoplasmático Liso (REL). O REL está envolvido na síntese e distribuição de hidratos de carbono, lípidos e hormonas. Também aqui, o “empacotamento” e distribuição de materiais ocorre pela formação e migração de vesículas.

Acontece que todo o retículo de cavidades e sáculos membranares é afinal contínuo entre si e desenvolve-se mais ou menos no interior da célula de acordo com a intensidade do seu metabolismo, num dinamismo constante. Comos antes dito e repetido, o CG “constrói-se” por fusão de vesículas provenientes do retículo, na face de formação dos dictiossomas, e “consome-se” na face oposta (face de formação) num processo de que se originam novas vesículas, as quais se destacam e transportam os materiais sintetizados e preparados para outras regiões da célula ou exportam-nos para o exterior dela - fenómeno de secreção - por exocitose.

Mas não é tudo, as membranas do retículo são uma extensão física da membrana externa do invólucro nuclear (IN). O invólucro nuclear é uma dupla membrana que abriga o material genético, que comanda a célula. Entre as duas membranas há um espaço. E é este espaço intermembranar que se continua pelo interior das cisternas do retículo.

Em resumo: para além da constituição fundamental e da estrutura básica comuns a todas as membranas, há interconversão e continuidade das membranas biológicas das células eucarióticas, desde a membrana mais externa do IN, às cisternas, túbulos e sáculos do RE, a que se segue o CG, passando pelas mais diversas vesículas contidas no citoplasma, até à membrana citoplasmática que delimita a célula. Ao sistema de membranas do interior da célula com estas relações e interconexões chamamos sistema endomembranar (endo = dentro). A ordem pela qual, resumidamente, referimos os seus componentes podia ser a inversa.

Acrescente-se apenas que organitos “semi-autónomos” como o cloroplasto e a mitocôndria não fazem parte do sistema endomembranar, por razões que estudaremos mais tarde.

José Batista d’Ascenção

sábado, 27 de fevereiro de 2021

Membrana celular e sistema endomembranar (I)

Por se destinar a alunos do ensino secundário, este texto procura seguir as regras ortográficas de 1990.

Imagem obtida aqui.

Qualquer ser vivo é constituído por uma ou mais células. E cada célula, ainda que tenha uma estrutura (das mais) simples, é sempre uma unidade funcional de metabolismo complexo rodeada por uma membrana (a membrana citoplasmática ou plasmática, também chamada plasmalema) que serve de fronteira e “alfândega” entre o meio intracelular (citoplasma) e o espaço exterior (meio extracelular). Todas as membranas são formadas por uma bicamada de fosfolípidos, com as partes polares ou carregadas das suas moléculas (as suas "cabeças") viradas para os meios aquosos externo e interno (já que são hidrofílicas), e as partes apolares (a que chamamos "caudas"), repelidas pela água (hidrofóbicas), dispostas de modo oposto formando o “miolo” da própria membrana. De um e de outro lado desta bicamada ou atravessando-a em toda a sua espessura, abundam proteínas, a que chamamos, respetivamente, proteínas periféricas (também chamadas extrínsecas) e proteínas integradas (também designadas intrínsecas). As proteínas membranares desempenham funções próprias e diversas, desde um papel estrutural a transportes de materiais específicos, por vários mecanismos, uns que consomem energia e outros não. Devido às propriedades das moléculas constituintes, as membranas são muito flexíveis e quer as proteínas quer os fosfolípidos podem difundir lateralmente no plano da membrana, com grande mobilidade. Este modelo base de membrana diz-se de “mosaico-fluido de Singer e Nicholson”, atendendo às suas características e em homenagem aos seus proponentes. Na superfície exterior da membrana celular, aos fosfolípidos e às proteínas associam-se frequentemente polissacarídeos, originando o que chamamos de glicolípidos e glicoproteínas. Outros componentes, como o colesterol, fazem também parte das membranas biológicas, intercalados entre os fosfolípidos. As moléculas de colesterol contribuem para a fluidez da estrutura membranar.

Como a espessura das membranas ronda os 100 Aº (Angstrom) [1 Aº corresponde a um décimo milionésimo do milímetro], a sua visualização não é possível com os microscópios óticos comuns, dado que o limite de resolução das imagens não o permite.

O metabolismo celular requer a contínua entrada na célula dos materiais necessários e a evacuação dos seus produtos, incluindo os resíduos tóxicos que é preciso remover. Estes materiais têm que atravessar a membrana plasmática. As membranas são também contínuas transdutoras de energia e informação. Tão complexa e intrincada é a atividade metabólica de cada célula que, comparando-a com a mais extensa cidade, esta (nos) parece mais simples, no seu funcionamento quotidiano.

Um facto muito curioso é que as substâncias que entram ou saem das células podem fazê-lo sem atravessar, de imediato, a espessura membranar. Na realidade, devido à sua fluidez e maleabilidade, a célula pode englobar porções de material (sólido ou líquido) por emissão de prolongamentos citoplasmáticos (pseudópodes), que são essencialmente projeções membranares, ou por invaginação da membrana, de que resulta a formação de vesículas com conteúdo, que se internam no citoplasma levando o material englobado ao seu destino. A este processo chama-se endocitose. O processo inverso também pode acontecer: lixo interno da célula ou componentes a exportar para o seu exterior (por exemplo o leite produzido nas células das glândulas mamárias), são trazidos através do citoplasma envolvidos em vesículas membranares que se aproximam da membrana citoplasmática e se fundem com ela, de modo a verter o conteúdo no espaço externo. A este processo chama-se exocitose. Deste modo, a área superficial da membrana citoplasmática mantém-se, nem encolhe nem aumenta significativamente, em consequência da complementaridade daqueles processos.

(Continua)

José Batista d'Ascenção

domingo, 21 de fevereiro de 2021

Fatores que afetam a atividade das enzimas (II): a presença de inibidores

Nota curta para alunos do ensino secundário; por essa razão o texto segue as regras ortográficas de 1990

Por último, as enzimas são muito sensíveis à presença de certas substâncias chamadas inibidores. Há inibidores que, por serem parecidos (estrutural e quimicamente) com o substrato, são capazes de se ligar ao centro ativo, bloqueando-o e impedindo a reação – são os inibidores competitivos. Outros ligam-se a zonas específicas das enzimas (que não o centro ativo), chamadas centros alostéricos, alterando a conformação e a estrutura da enzima, de que resulta a modificação do centro ativo, o que impede a ligação entre este e o substrato – são os inibidores não competitivos.

Os inibidores competitivos, como o nome indica, competem com o substrato pela ligação ao centro ativo. Quando um inibidor competitivo está presente há centros ativos (ocupados) que (por isso) não se ligam ao substrato e, portanto, a velocidade das reações é mais baixa. Porém, se se aumentar cada vez mais a concentração de substrato aumenta-se a probabilidade de cada enzima se encontrar com o substrato em vez de se encontrar com o inibidor. Assim, a velocidade da reação aumenta. E, se continuarmos a aumentar a concentração de substrato, a presença do inibidor torna-se irrelevante, pelo que a velocidade da reação se aproxima muito ou atinge mesmo a velocidade máxima: o efeito do inibidor desaparece.

Os inibidores não competitivos ligam-se a centros alostéricos, isto é, a locais diferentes do centro ativo. Portanto, não competem com o substrato pela ligação ao centro ativo. Cada inibidor que se liga a uma dada enzima altera-lhe a estrutura, alterando-se também o centro ativo, o que impede a ligação entre a enzima e o substrato. É como se essa enzima estivesse a menos. Assim, há um efeito de diminuição da velocidade da reação por cada inibidor que se liga a uma enzima. Nestes casos, o aumento da concentração de substrato pode fazer aumentar a velocidade da reação, mas apenas enquanto (e se) houver enzimas (centros ativos) que não tenham sido afetadas pelo inibidor, porém, por mais substrato que se acrescente, como não há competição entre substrato e inibidor, a velocidade da reação nunca atinge o valor máximo que atingiria se o inibidor não estivesse presente. Isto é, o aumento da concentração de substrato não pode anular o efeito do inibidor.


José Batista d'Ascenção

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Fatores que afetam a atividade das enzimas (I): concentração de enzima, concentração de substrato, temperatura e pH

Apontamento para alunos do ensino secundário, razão por que o texto segue as regras ortográficas de 1990

Quando pensamos na atividade de uma enzima podemos pensar em termos do seu centro ativo. Assim, quantos mais centros ativos (mais enzimas…) estiverem operacionais num dado momento maior é a velocidade da reação. Ou seja: para condições definidas e considerando muito abundante (saturante) a concentração de substrato (às vezes dizemos, havendo “excesso” de substrato) relativamente à concentração de enzima, a velocidade da reação é diretamente proporcional à concentração de enzima (ao número de centros ativos a operar). 

Podemos também considerar a variação da velocidade da reação em função da concentração de substrato, para uma dada quantidade [concentração] de enzima. Para baixas concentrações de substrato, muitos centros ativos estão desocupados e a velocidade da reação é baixa. Para concentrações de substrato muito baixas, qualquer aumento dessas concentrações tende a aumentar proporcionalmente a velocidade da reação. Ao aumentarmos a concentração de substrato aumentamos o número de centros ativos a trabalhar e a velocidade aumenta. Quando aumentarmos a concentração de substrato de tal modo que todos os centros ativos fiquem ocupados obtemos uma velocidade da reação que é máxima para aquela enzima, naquelas condições. A partir daí, se continuarmos a aumentar a concentração de substrato a velocidade máxima mantém-se constante porque os centros ativos estão todos ocupados.

A temperatura condiciona enormemente a atividade enzimática. Cada enzima tem normalmente uma temperatura ótima de atuação. De modo genérico, baixando a temperatura (a partir do ponto ótimo) diminui a atividade das enzimas até um ponto em que elas deixam de atuar. A energia vibracional (cinética) dos átomos da enzima torna-se cada vez menor e a sua capacidade catalítica diminui, no entanto, a sua estrutura em nada é alterada. E, por isso, este efeito é reversível: basta elevar a temperatura e a catálise volta a ocorrer normalmente. Ao contrário, se aumentarmos a temperatura para lá da temperatura ótima, a atividade enzimática diminui até se anular; mas este efeito é normalmente irreversível porque ocorre desnaturação das enzimas (que são proteínas). Isto quer dizer que a estrutura proteica é alterada, sendo destruído o centro ativo, e, por isso, cada enzima desnaturada é uma enzima perdida.

O modo como as enzimas se comportam em função da temperatura pode ter aplicações úteis muito importantes. Assim, enzimas que suportam altas temperaturas dizem-se termorresistentes e podem ser usadas em processos químicos e/ou industriais que requerem temperaturas altas. Ao invés, processos químicos e/ou industriais que funcionam com enzimas capazes de atuar a temperaturas baixas evitam o desperdício de energia necessária para aquecer as câmaras de reação e podem ser ecologicamente úteis uma vez que não se lançam efluentes quentes nos esgotos (por exemplo a água suja de máquinas de lavar roupa em que, junto com o detergente, foram usadas enzimas para digerir certos resíduos de sujidade).

Nos seres vivos, a influência da temperatura sobre as enzimas tem uma importância determinante. Um exemplo é a hibernação de certos animais. Como esses animais têm que gerir o consumo de reservas energéticas durante o período de dormência, de modo a fazê-las chegar até à altura de se poderem alimentar de novo, é útil que as enzimas funcionem a um ritmo muito lento (que a temperatura baixa não permite que seja maior), desacelerando o metabolismo até níveis basais. Desse modo é doseado automaticamente o consumo de energia…

Uma aplicação prática da influência das baixas temperaturas na atividade enzimática é a conservação de alimentos por ação do frio, em frigoríficos e congeladores. Os alimentos são constituídos por matéria orgânica que é usada por diversos micróbios para obtenção de energia, com a consequente degradação desses alimentos. Ora, colocando-os no frio diminui-se a capacidade catalítica das enzimas microbianas e assim se atrasa a sua decomposição. Se a temperatura for muito baixa, como no caso da congelação, as enzimas ficam inativas, pelo que o metabolismo dos micróbios fica parado, o que permite, em condições adequadas, conservar os alimentos por períodos muito longos. Naturalmente, percebe-se facilmente que qualquer alimento congelado não se deve deixar descongelar e voltar-se a congelar, dado que, nesse caso, as enzimas dos micróbios, no intervalo de tempo em que a temperatura sobe, recuperam a sua atividade (porque estavam apenas inativas, mas não destruídas), restabelecendo o metabolismo e degradando os alimentos.

Relativamente ao pH (valor da acidez, da neutralidade ou da alcalinidade do meio), cada enzima apresenta também um valor ótimo de atuação. Variando o pH, acima ou abaixo do ponto ótimo, exercem-se efeitos na estrutura (proteica) das enzimas efeitos que, a partir de certos limites, se tornam irreversíveis. Assim, valores extremos de pH, relativamente ao valor ótimo de uma enzima, afetam irreversivelmente essa enzima. Como é óbvio, há enzimas que atuam otimamente em meio ácido (caso da pepsina, no estômago), outras em meio neutro e outras em meio básico. Enzimas diferentes podem apresentar tolerâncias muito variáveis às modificações de pH.


José Batista d'Ascenção

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Catalisadores biológicos ou enzimas.

Apontamento para alunos do ensino secundário. Por esse motivo, o texto segue as regras ortográficas de 1990

As reações metabólicas são catalisadas por enzimas. As enzimas são quimicamente proteínas. Normalmente, as enzimas apresentam dimensões muito maiores (são macromoléculas) do que as dimensões do(s) substrato(s) sobre o qual ou sobre os quais atuam. Todas as enzimas têm uma configuração espacial determinada (estrutura terciária ou quaternária…) com uma zona especial onde se faz a ligação temporária ao(s) substrato(s) – o centro ativo. É a estrutura tridimensional da proteína que determina a configuração do centro ativo, a região fundamental que permite a sua ação. Se a estrutura de uma enzima for afetada e o centro ativo for destruído, essa enzima perde a sua capacidade catalítica.

A catálise de reações por meio de enzimas deve-se, portanto, à formação de um complexo temporário (de duração muito curta) entre o(s) substrato(s) e o centro ativo da enzima respetiva, facto que se traduz na diminuição da chamada energia de ativação. A energia de ativação é a energia necessária para que as moléculas de substrato colidam entre si e entrem em reação.

A formação do complexo enzima-substrato exige afinidade química entre o centro ativo e o substrato, o que também obriga a que a geometria de um e do outro sejam compatíveis. Isto tem outras implicações: cada enzima é específica para um dado substrato, ou melhor, para uma dada reação química. Se uma enzima catalisa apenas a reação de um ou mais substratos, sempre e só os mesmos, diz-se que tem especificidade absoluta. Se, porém, catalisa a reação de uma dada categoria de substratos, do mesmo tipo mas diferentes entre si, dizemos que aquela enzima tem especificidade relativa.

O modelo atualmente aceite para a atuação das enzimas é chamado modelo da adaptação induzida, de Koshland. Segundo este modelo, mais importante do que a geometria específica do centro ativo é a sua afinidade química com o substrato, levando a que, quando se forma o complexo enzima-substrato, o centro ativo da enzima se ajuste à forma do substrato, de modo análogo ao que acontece com uma luva quando a calçamos. Inicialmente pensava-se que enzima e substrato(s) apresentavam formas complementares rígidas tal como uma chave e a respetiva fechadura. Esse modelo acabou por ser abandonado. 

Há vários fatores que afetam a atividade das enzimas, influenciando a velocidade das reações. Os mais importantes são: a quantidade (concentração) de enzima, a quantidade (concentração) de substrato, a temperatura e o pH; outro fator importante diz respeito à presença ou ausência de inibidores. Abordá-los-emos em textos publicados a seguir.

José Batista d'Ascenção

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

Importância da água para os seres vivos: características moleculares, propriedades e funções



Tabela-resumo para alunos de 10º ano (ver nota abaixo)


Nota: para desenvolvimento e melhor elucidação dos conceitos e das suas inter-relações consultar este texto.

    José Batista d'Ascenção

terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

E agora o ensino à distância – um desafio (ainda) mais difícil

Imagem colhida via google: aqui.

Não terá sido uma “fuga em frente”, foi mais uma inércia cega e errática, face às pressões que a exigiam: governo, directores escolares, com destaque para a voz do seu presidente corporativo, representantes dos pais e uma plêiade de “especialistas”, apoiados na falta de “evidências científicas”, tardaram no fecho das escolas, até ao momento em que a realidade se impôs. Mas as responsabilidades estão bem repartidas e a larga maioria de nós não lhes escapa.

Atrapalhados e mal preparados, temos agora uma realidade escolar muito mais difícil, agravada pelo facto de não sabermos quanto tempo vai durar. Assim mesmo, cabe-nos a dose de serenidade necessária para limitarmos os estragos, olhando para as nossas crianças e jovens, com a firme determinação de lhes fazermos sentir que há um conjunto de doenças individuais e sociais para vencer que não diminuem o afecto que lhes temos nem afectam a nossa obrigação de os proteger e de os ensinar. Enquanto aguardamos o regresso à escola, que é o sítio e o meio ideal para isso.

A situação e os tempos estão nebulosos, as estratégias do tipo «barata tonta» nunca resultaram, os meios tecnológicos são imprescindíveis, mas, para além das limitações intrínsecas, não resolvem a impreparação, a desorganização, a burocracia e a incompetência estrutural nem, muito menos, são imunes aos negócios oportunistas e ao desperdício. Seja como for, estamos cá.

Apanhamos os cacos, compomos o jardim e cuidamos das flores. Com empenhamento e a humildade de reconhecer erros e aprender sempre. Para podermos ensinar alguma coisa.

Hoje e amanhã.

Até já.

José Batista d’Ascenção


quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Diversidade de seres vivos, a classificação em reinos, segundo Whittaker – nota para alunos de 10º ano

Fonte da imagem: aqui.

Já na segunda metade do século XIX, propôs-se um terceiro reino, para além de animais e plantas, onde se englobavam todos os seres vivos conhecidos nem claramente animais nem vegetais. Esse novo reino, de abrangência variável, segundo diferentes autores, foi designado, já no século XX, Reino Protista.

Após o grande avanço técnico que permitiu a invenção do microscópio electrónico, entendeu-se que, sendo tão grandes as diferenças entre células procarióticas (identificadas desde 1878, por Haeckel) e eucarióticas, devia criar-se um novo reino que incluísse todos os seres procariontes, (todos os tipos de bactérias) - e foi aceite o Reino Monera.

Em 1969, Whittaker propôs um novo reino para incluir os fungos (cogumelos, bolores, leveduras), seres eucariontes com importantes características distintivas. Segundo Whittaker, passaria a haver cinco reinos: Monera, Protista, Fungi, Plantae e Animalia. Devido a dificuldades várias com a distribuição em reinos de muitos seres eucariontes, Whittaker modificou os seus próprios critérios. Por exemplo, para não separar as algas verdes, que incluem formas unicelulares, coloniais e multicelulares, por dois reinos, propôs que se incluíssem no Reino Protista os seres multicelulares sem apreciável diferenciação de tecidos. Os fungos flagelados foram também “puxados” para o mesmo reino.

À classificação em reinos de Whittaker, situada no tempo, e já desactualizada, sucederam-se muitas outras classificações de outros autores, com novos dados, mas os seus critérios conservam interesse, coerência e alguma simplicidade, pelo que se mantêm no programa. Esses critérios base são:

A estrutura e organização celular: Seres procariontes unicelulares ou coloniais (Reino Monera). Seres eucariontes unicelulares, coloniais ou multicelulares com diferenciação reduzida (Reino Protista). Seres eucariontes multicelulares com células uninucleadas, com cloroplastos e paredes celulares celulósicas (Reinos Plantae) e sem paredes celulares nem cloroplastos (Reino Animalia). Seres eucariontes com paredes celulares quitinosas, sem cloroplastos (Reino Fungi).

O tipo de nutrição:

Por absorção de nutrientes a partir do ambiente: parte dos seres do reino Monera, alguns do reino Protista e todos os do reino Fungi;

Por autotrofia, particularmente a fotossíntese: as bactérias autotróficas, os seres autotróficos do reino Protista, designadamente as algas (unicelulares, coloniais e pluricelulares) e todas as plantas;

Por ingestão do alimento (matéria orgânica) para o interior do corpo, onde vai ser digerido e assimilado. Este modo de nutrição encontra-se em alguns protistas e é característico de todos os animais (que derivaram de formas antigas de seres daquele tipo por evolução).

O papel desempenhado nos ecossistemas (traduzido nas posições que os diferentes seres vivos ocupam nas cadeias alimentares):

Seres produtores: são todos os que produzem o seu alimento (matéria orgânica) a partir de matéria mineral (inorgânica). Dizem-se, por isso, autotróficos. O principal processo de autotrofia é a fotossíntese. Pela fotossíntese, na presença de luz, água e dióxido de carbono são usados pelos seres com clorofila para produzirem compostos orgânicos como a glucose. Nesse processo, liberta-se um resíduo que é o oxigénio gasoso. Quimicamente, o processo é o seguinte:

6CO2 + 6H2O -------> C6H12O6 + 6O2

Seres macroconsumidores: São todos os seres vivos que precisam de ingerir matéria orgânica (alimento), obtida dos seres vivos que consomem. Dizem-se, por isso, heterotróficos (por ingestão).

Seres decompositores ou microconsumidores: São todos os seres vivos, como as bactérias heterotróficas e os fungos, que absorvem matéria orgânica digerida extracorporalmente, e a transformam em matéria mineral que devolvem ao meio ambiente, onde fica disponível para os produtores. 

José Batista d’Ascenção

Da origem à diversidade de seres vivos – nota para alunos de 10º ano

Imagem da Wikipédia

Todos os organismos vivos são constituídos por unidades compartimentadas, de funcionamento bioquímico complexo, a que chamamos células (pequenas “celas”). Dizemos, por isso, que as células são as unidades estruturais e funcionais dos seres vivos. Os vírus são partículas biológicas que usam células específicas para se multiplicar, mas que não têm qualquer metabolismo (não se alimentam, não crescem, nem se reproduzem por si), pelo que não são seres vivos.

Surgidas na Terra há menos de 4000 milhões de anos (Ma), as primeiras células tinham uma organização (mais) simples. Algumas destas células englobavam outras para se alimentarem, mas porque, nalguns casos, as células englobadas realizavam alguma função útil, foram poupadas à digestão e passaram a viver em endossimbiose: recebiam alimento da célula hospedeira e forneciam-lhe alguma coisa útil em troca. Por evolução, ao longo de centenas de Ma, formaram-se células mais complexas a partir das associações de sucesso, de que resultou uma variedade de “órgãos pequenitos”, a que demos o nome de organitos ou organelos, cada um deles com uma importante função específica na célula.

Às células complexas providas de núcleo e de organitos membranares chamamos células eucarióticas (do grego: eu = verdadeiro e káryon = núcleo;) e àquelas que não apresentam núcleo nem a mesma riqueza de organelos membranares designamo-las por células procarióticas (organização anterior à existência de núcleo).

Por definição, um ser vivo tem, no mínimo, uma célula – diz-se, então, um ser unicelular. Se vários seres unicelulares idênticos vivem tipicamente agrupados, mas sem grande colaboração entre as diferentes células, chamamos a essa estrutura viva um ser colonial. Dos seres unicelulares e coloniais, alguns são formados por células procarióticas – são seres procariontes – e outros são formados por células eucarióticas – trata-se de organismos eucariontes.

Por especialização e diferenciação progressiva das células de alguns seres coloniais eucarióticos, a evolução biológica resultou em seres pluricelulares de organização muito complexa, formados por tecidos celulares muito diferentes (conjuntos de células de forma e fisiologia idêntica que desempenham a mesma função, como por exemplo as células de diferentes tipos de músculos, as do cérebro ou as do fígado, etc.), que constituem os diferentes órgãos (coração, rins, etc.) os quais formam os diversos aparelhos ou sistemas (de reprodução, de excreção, de transporte…) de cada organismo complexo - são seres eucariontes pluricelulares.

Antes da invenção dos microscópios, não se conheciam os seres vivos de dimensão mais pequena, particularmente os unicelulares. Só com a ajuda de lentes e de sistemas de lentes foi possível observar os micróbios. Até essa altura, os seres vivos eram arrumados em dois grandes grupos, chamados reinos: o Reino Animal e o Reino Vegetal.

Naturalmente, esta divisão passou a ser insuficiente…

José Batista d’Ascenção